RESPM-20 anos
Ética Revista da ESPM | julho/agostode 2014 30 do you think you are? ). Enquanto alguns povos reagem às manifestações de prepotência vindas de cima com o questionamento do caráter da pessoa, nós deitamos nossa superioridade sobre quem estiver emposição de nos enfrentar. Essa complacência para consigo própria, aliada à preponderância do interesse privado sobre o público, criou esse ambiente de prevalência da ambi- ção sobre a retidão, da cupidez sobre o dever, e que foi uma das bases do famoso “jeitinho”, o que se tornou traço marcante da elite brasileira. Severa, ela o era com escravos e subalternos. Com os trabalhadores, fossem livres ou escravos, o rigor era imposto pelas necessidades da produção. Exigiam-se disciplina, aplicação, diligência, empenho, enquanto existia uma mal disfarçada displicência, gerada por essa aversão ao trabalho manual que as elites cultiva- vam zelosamente. Essa ambivalência cultural acabou por fazer com que a sociedade praticasse uma obtusa noção de direitos e deveres da cidadania. A sociedade podia até mostrar aspirações por mais seriedade, cla- mava episodicamente por maior severidade na vida social, mas nunca fez dessa aspiração ética uma prá- tica cultural consistente. Tivemos, claro, pessoas extraordinárias, capazes de provar que uma regra sempre tem exceções, algumas magníficas, mas não há como não reconhecer que o bra- sileiro foi se forjando displicente em relação a deveres. Pelo lado bomque sempre existe nas coisas, nos deu um pouco dessa bonomia, desse relaxamento, desse prazer de viver que faz nosso charme para o resto do mundo. Por outro lado, se olharmos para as bases da pirâ- mide social com um olhar sincero, sem idealizações demasiadamente românticas, também não encontra- remos umambiente cultural mais rigoroso do ponto de vista ético. Os portugueses pobres que vieram ganhar sua vida no país não tinham formação especial. Eram, na imensa maioria, iletrados, tinham baixa formação técnica, e muitos vinham para escapar do sistema penal. Sem uma base educacional e sem uma religião Aprecariedade do ambiente físico, a superlotação e a desorganização dos processos internos têmde ser compreendidas como aquilo que de fato são: uma punição adicional à perda da liberdade, uma forma sutil de tortura
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