RESPM_MAR_ABR_2015 ALTA

entrevista | Luiz Carlos Mendonça de Barros Revista da ESPM |março/abril de 2015 14 Alexandre — O que a “voz das ruas” traz de novo para quem elabora e ana- lisa cenários? Luiz Carlos — O Brasil está vivendo o fim de um ciclo econômico de cur- to prazo junto com o fim de um ciclo político. Quando você combina es- sas coisas, cria um quadro difícil de acompanhar. Alexandre — Por que difícil? Luiz Carlos — Talvez em 80% das vezes em que alguém se mete a fazer um planejamento estratégico, adota um raciocínio baseado nos fatos correntes. Você olha para trás, para os dados disponíveis, e assume que, caso não haja nenhuma ruptura es- trutural no presente, pode projetar esses dados para o futuro. Normal- mente dá certo; há instrumentos e mecanismos para fazer isso. Só que há alguns momentos da história em que isso não funciona. Alexandre — Por que não? Luiz Carlos — Porque você está vi- vendo uma ruptura com o passado. Alexandre — Como se deu esta rup- tura? Luiz Carlos — Em 2012, você tem uma primeira ruptura do padrão econômico. A China começa a de- sacelerar e muda o padrão do seu crescimento. Com isso, o preço das commodities entra em queda e os termos de troca das exportações brasileiras pioram uns 20%. Já nesse momento, para quem acompanha a conjuntura do ponto de vista estru- tural, e não só fatos correntes, fica claro que aquele ambiente favorável para a economia estava começando a mudar — por razões externas e in- ternas. O crescimento acelerado do período Lula levou ao surgimento de gargalos dentro da economia. O mais importante é o mercado de trabalho. O país chegou a um nível de desemprego bai xíssimo. Um nível em que a teoria mostra que a inflação começa a subir, porque a oferta de trabalho já não supre mais a demanda, e os salários começam a aumentar. Alexandre — Uma situação típica de países em regime de pleno emprego. Luiz Carlos — Mas o Brasil tem uma estrutura sindical muito po- derosa. Aí é juntar a fome com a vontade de comer... Com a escassez no mercado de trabalho, os sindica- tos começaram a exigir aumentos e distribuição de lucros. Havia, ainda, outros sinais de esgotamento: infra- estrutura e energia elétrica. Naque- le momento, uma leitura econômica clássica seria a seguinte: é hora de dar uma freada de arrumação. Só que a Dilma fez a leitura oposta. Como a economia começou a perder fôlego, ela tomou medidas anticícli- cas. Aí foi o erro total. Os problemas que estavam começando a aparecer se tornaram mais graves. Agravou- se a crise econômica de uma forma tal que o ciclo político que estava normalizado — tanto que ela ganhou a primeira eleição com uma baita diferença e chegou a ter, nos primei- ros anos do primeiro mandato, mais aprovação do que o Lula — começou a se esgotar. Ela não percebeu e foi para a segunda eleição usando um instrumento de marketing que era chamar a atenção do eleitor para a melhora da sua vida. Alexandre — E funcionou. Luiz Carlos — Porque é absolu- tamente verdade. Quando o Lula tomou posse, apenas um terço dos brasileiros vivia na economia for- mal. Isto é, com um contrato de trabalho legal, registrado, direitos trabalhistas e Fundo de Garantia. Quando a presidente Dilma é eleita, na segunda campanha, 70% dos brasileiros estavam nessa condição. Ela disse: “Olha o que você era, olha o que você é hoje e me dá mais uma chance”. E foi eleita assim. Alexandre — Então, onde está o erro? Luiz Carlos — Ela foi eleita com um truque de marketing. Prometeu não fazer coisas que depois teria de fazer. Ela chama a atenção para isso quando coloca [no comando da eco- nomia] uma pessoa absolutamente fora do universo dela, um cara duro [Joaquim Levy]. Corretamente, do OBrasil está vivendo o fimde umciclo econômico de curto prazo junto como fimde umciclo político. Quando você combina essas coisas, cria um quadro difícil de acompanhar

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