RESPM-SET_OUT-2015-baixa
entrevista | Luiz Augusto de Castro Neves Revista da ESPM | setembro/outubrode 2015 82 combatendo os Estados Unidos e ou- tra fora de lá pleiteando empréstimo americano para resolver problemas de caixa. Com quem o Brasil deve se alinhar? Poderia adotar uma linha mais eclética, mais flexível, como a adotada pelo Japão e pela Alemanha, depois da Segunda Guerra Mundial, quando esses países ampliaram seu leque de relações internacionais. Revista da ESPM — Em termos de ali- nhamento, com que países o Brasil tende a ter relações mais consistentes? Com a Europa? Castro Neves — A dicotomia Estados Unidos/Europa não existe mais. Isso está se esgotando. O Brasil é um país ocidental. Essa pode ser uma direção. Na minha visão, o Brasil deve cami- nhar com o objetivo de se tornar um país do Primeiro Mundo e não, neces- sariamente, se alinhar com países do Terceiro Mundo. Negociações com esses países são importantes, mas o objetivo é integrar o time dos países desenvolvidos. Nossos valores não são os asiáticos. São mais democráti- cos, de tradição ocidental. O modo de ser asiático procura exaustivamente a harmonia, conforme a filosofia de Confúcio. O dissenso, comum na de- mocracia, não faz parte dessa visão. O Brasil deve escolher o mundo que lhe está mais próximo politicamente. Por outro lado, o país não deve se eximir de assumir a liderança na América do Sul, afinal é omaior país na região, em termos de território e de economia. Se oBrasil crescer e se desenvolver, a ten- dência é os países vizinhos se aliarem a ele. Numa cooperação hemisférica, é natural haver uma estratégia comum entre os dois maiores países, Estados Unidos e Brasil. Na América Latina há uma miríade de siglas e de foros, cujo propósito principal é excluir os Esta- dos Unidos. Cada umdesses foros tem um ponto de vista diante dos norte-a- mericanos, o que enfraquece a todos. Revista da ESPM — Nas negociações, temos posiçãomais ideológica coma Eu- ropa emais peso econômico comos Esta- dos Unidos. OMéxico aumenta cada vez mais sua integração econômica com os norte-americanos. Nesse contexto, a ne- gociação coma Europa é mais factível? Castro Neves —Os europeus sãomais protecionistas que os americanos. Sempre foram. Basta ver as negocia- ções na pauta agrícola. É uma pedrei- ra. As negociações com os europeus se estendem desde 1995. Ou seja, 20 anos de negociação, sem resultados plausíveis. Negocia-se com a Europa por um viés antiamericano. Isso não funciona. Se não simpatizo com os americanos, vou negociar com os europeus. Agora, os americanos nego- ciam diretamente com os europeus e dão adeus aos brasileiros. Revista da ESPM — Que podemos es- perar das duas visitas da chanceler Ange- laMerkel ao Brasil emapenas umano? Castro Neves — A Alemanha é a lo- comotiva que puxa a economia da Europa após sua recuperação no pós- guerra. A vinda de Angela Merkel ao nosso país se compreende. São Paulo é o maior estoque de investimento alemão no mundo, superando mesmo as cidades alemãs de Frankfurt, Stutt- gart e Munique. Mesmo sem missões específicas nessa viagem, Merkel vê o Brasil como parceiro importante, como importador. É grande em terri- tório e população, com mais de 200 milhões de habitantes. Não importa o momento atual de crise. O Brasil tem perfil e portfólio suficientes para corresponder às expectativas alemãs. Revista da ESPM — Qual o dever de casa do Brasil para sair dessa crise e inserir-se na cadeia global? Castro Neves — Hoje, o mundo cresce na base da economia de mercado. O país deve abrir mais suas atividades econômicas para que se diminuam preços, custos e aumente a produtivi- dade. Não deve adotar a proteção es- tatal como estratégia ante o temor de empresas caírem em mãos estrangei- ras, exceto quando se trata da defesa nacional. A tecnologia é fundamental para criar relações de poder e de com- petição nomercado global. Revista da ESPM — Em termos estra- tégicos, em que segmentos o Brasil tem mais potencial para se desenvolver? Castro Neves — O Brasil tem as suas vantagens: grande território e grande população. Tem potencial para cres- cer em todos os setores. O nosso de- safio é saber qual o caminho em que podemos ser mais competitivos. Fa- zer tudo não é possível. De todomodo, é necessário enxugar a máquina do Estado e diminuir a carga proporcio- nada pelo excessivo número de regras trabalhistas. A legislação trabalhista atual tem o defeito de proporcionar salários baixos e mão de obra cara. Ela é de origem fascista, e seu maior problema é inibir a criação de empre- gos. Enfim, nosso problema é fazer definições e listar prioridades.
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