RESPM-JAN_FEV 2016

JANEIRO/FEVEREIRODE 2016| REVISTADAESPM 49 nharia, administração e medicina — das áreas científicas e estabeleça regras distintas para cada uma delas — tanto para dar nota quanto para os financiamentos. Na hora de contratar um professor para o curso de tecnólo- go, a universidade pode contratar um mestre que se formou há seis meses e nunca trabalhou na área ou um engenheiro que há 20 anos trabalha em montadora. Mas, se ela contratar o engenheiro, a nota do MEC baixa. É claramente o corporativismo aplicado na prática e um dos grandes erros da nossa legislação. Revista da ESPM — Em um dos seus artigos, o senhor cita o sistema Dual alemão de ensino, que mistura trabalho com sala de aula para a formação do ensino médio. Este seria o caminho para o Brasil formar profissionais melhores? Castro — Na Alemanha, existe uma tradição que vem da época medieval, das guildas, das corporações de ofício — que se encarregavam da preparação da mão de obra em todos os níveis —, do mestre ao aprendiz, onde se aprende o ofício no local de trabalho. No sistema Dual alemão, o aluno tra- balha quatro dias e estuda um. Hoje, dois terços da juventude alemã entra nesse sistema. Nos últimos anos, um estado alemão passou a aplicar esse sistema nos cursos de engenharia e administração do ensino superior, no qual o aluno passa três meses traba- lhando e outros três meses estudando até se formar e é acompanhado por um orientador na empresa e outro na escola. Lá, o retorno emtermos de pro- dutividade é elevado. Acredito nesse tipo de ensino. Tanto que estou plane- jando trazer essemétodopara oBrasil. O plano ainda não saiu do papel, mas a ideia é montar um curso superior de engenharia emBeloHorizonte. Revista da ESPM — Muitos observa- dores internacionais, como o economista Mark Lutz, do Banco Mundial, acredi- tam que o Brasil peca pela lentidão na introdução de novas tecnologias nos processos de produção e distribuição das empresas. De certa forma, está faltando o “meio-de-campo” de engenheiros e técnicos capazes de implementar novas tecnologias já disponíveis, em benefício próprio. Apenas para efeito de compara- ção, o Fórum Econômico Mundial consi- dera que essa capacidade de adaptação rápida é umdos fatoresmais importantes para a obtenção da competitividade em escalamundial. Castro — Isso é um problema sério, porque aqui temos o técnico, o tec- nólogo e o profissional graduado em quatro anos. Mas a lei brasileira não permite que matérias do curso téc- nico substituam as do ensino médio. Isso só acontece aqui e faz com que o técnico seja, na verdade, um pós-se- cundário, que faz o curso umano após a sua formação. Logo, para quase dez milhões de alunos no ensino médio, temos ummilhão no técnico — umnú- mero baixo, se considerarmos que na maior parte dos países europeus esse índice vai de 30% a 70%. Revista da ESPM — Para concluir, levando em conta tudo o que aqui foi dito, o senhor poderia listar os grandes problemas que concorrempara dificultar a inovação no Brasil? Castro — Em primeiro lugar, aparece o fator cultural de uma sociedade que não valoriza a inovação nem oferece a educação necessária para estimular a criatividade em áreas aplicadas, de ciência e tecnologia. Com uma base de recrutamento menor, a inovação fica circunscrita a uns poucos gênios que aparecem e aos enclaves univer- sitários, onde você tem um caldo de cultura capaz de gerar esses valores que produzem a tecnologia brasileira. Na verdade, o grande desafio do Brasil é dar uma boa mexida no sistema educacional, visando melhorar a qua- lidade do ensino. Precisamos ter uma escola básica que consiga ensinar os alunos a ler, escrever, usar núme- ros e elaborar tabelas. Antigamente, quando eu era aluno, nemmetade dos brasileiros da minha idade frequenta- vam a escola. Hoje, todo mundo está na escola, mas o ensino émuito ruim. Revista da ESPM — E como o senhor vê o futuro do Brasil? Castro — Nós temos um obstáculo no presente e não sabemos como sair dele. Agora, o Brasil sempre teve todos os requisitos para não dar certo: é um dos países mais pobres, analfabetos e atrasados da América Latina. Há pouco tempo, éramos mais pobres que o Peru. Até uma geração atrás, os índices de escolaridade do Paraguai e da Bolívia eram melhores do que os do Brasil. E o fato de conseguirmos chegar até aqui já foi um verdadeiro milagre! O que falta agora é suplantar essa transição, não sabemos como vai acontecer e quanto tempo vai levar para a implementação desses acertos. Mas o fato é que o Brasil precisa de um governo mais competente, uma burocracia menos invasiva, um grau maior de pragmatismo no processo decisório e uma enorme reforma na educação de todo o dia. Nosso feijão comarroz deve sermais bemfeito! E S P E C I A L I N O VA Ç Ã O

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