RESPM_MAR_ABR 2016

entrevista | José Goldemberg Revista da ESPM |março/abril de 2016 90 gia? Por que o Brasil, com iluminação abundante, avançou tão pouco? Goldemberg — Aqui no Brasil, as placas solares ainda são muito ca- ras. Elas têm vindo da China, mas o preço permanece bastante elevado. Há duas maneiras de a energia solar ocupar mais espaços. Uma primeira é individual, colocando-se os refle- tores nos telhados das casas ou de outros prédios. Outra é por meio de corredores de coletores, chegando a ter vários quilômetros. No curto prazo, porém, a energia solar é pou- co competitiva. Revista da ESPM — Que modelos po- deriam funcionar para estimular essa matriz no Brasil? Nos Estados Unidos, empresas estão explorando o serviço em um modelo de assinaturas, no qual os usuários não precisam comprar a estrutura. Na Alemanha, os clientes arcam com os painéis e vendem a ener- gia excedente às empresas públicas de distribuição. Na França, já existem iniciativas de capacitar rodovias para a geração de energia do sol. Goldemberg — Brasília e Belo Ho- rizonte já têm muitos telhados co- bertos com painéis. Concessioná- rias vendem à noite e compram do usuário de dia. Mas há um proble- ma fiscal. Quando o cliente com- pra à noite, paga ICMS. Quando ele vende, não há cobrança desse imposto, o que gera distorções nas importâncias de compra e venda. As autoridades do setor de energia estão tentando tirar a cobrança do imposto. No Texas [EUA], as empre- sas distribuidoras estão mudando seu tipo de negócio. Não estão pro- duzindo energia, mas apenas ge- renciando a sua compra e venda. A principal fonte de renda delas tem sido a manutenção da rede. Revista da ESPM — A interven- ção desastrada do governo nos fez recuar muitos anos na produção do etanol de cana-de-açúcar. De todo modo, o Brasil atingiu um nível de produção sem paralelo no mundo. O etanol ainda tem espaço para cres- cer? O que ainda podemos esperar dessa fonte de energia? Goldemberg — Das 400 destilarias que existiam em operação no país, 80 delas “quebraram”. Desde 2008, manteve-se a gasolina no mesmo preço, “quebrando” a Petrobras e as destilarias, porque o preço do eta- nol segue o preço da gasolina. Isso trouxe quebradeira, inviabilizando o setor. Acredito que a liberaliza- ção de preços daria novo alento a essa indústria. Revista da ESPM — Como fica a abordagem sobre o etanol em um mo- mento de forte depressão dos preços do petróleo? Goldemberg — Na COP-21, o Brasil propôs dobrar a produção do etanol. Temos hoje dez milhões de hectares para fazer etanol e açúcar. Dimi- nuindo o espaço de criação de gado com métodos mais apropriados de produção intensiva, teríamos de cinco a dez milhões de hectares a mais para cana, dobrando a produ- ção de etanol e açúcar. Há implica- ções ambientais que poderiam di- ficultar essa meta, mas sem dúvida temos espaço para crescer e reduzir nossa dependência do petróleo usando uma matriz mais limpa. Revista da ESPM — Os produtores de cana-de-açúcar afirmam que o país poderia produzir uma nova “Itaipu” a partir da biomassa. Contudo, há muita reclamação com a maneira como esse mercado foi regulamenta- do. Como poderíamos explorar melhor essa matriz que é um subproduto do etanol e do açúcar? Goldemberg — É preciso ver como eram os primeiros leilões de ener- gia, operados por razões marcada- mente ideológicas. Em 2004, quan- do os leilões começaram, todas as fontes de energia concorriam num mesmo leilão. Isso trazia dificul- dades, porque cada produto ener- gético tem um preço diferente. Depois, os leilões das diferentes energias foram separados. Demo- rou-se de cinco a dez anos para regular as energias renováveis, como hidrelétrica, eólica, solar, biomassa etc. O ponto importante é tratar essas fontes de energia a partir de suas particularidades e desenhar um modelo que estimule de fato as fontes renováveis. Mais do que falar em novas fontes, uma área que exige mais pesquisa é o armazenamento de energia. O vento pode parar e durante a noite não há luz solar!

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