RESPM SET-OUT 2016

entrevista | Nicola Calicchio Neto Revista da ESPM | setembro/outubrode 2016 104 A questão é que precisamos quebrar alguns paradigmas. No Brasil, tem sempre alguém que diz: “Ah, mas aqui isso não funciona”. É como na questão trabalhista dos turnos de 12 horas. É preciso criar algumas flexi- bilidades. É assim que funciona no mundo inteiro. Revista da ESPM — Falando sobre paradigmas, no Brasil há uma discus- são muito séria sobre a dificuldade em inovar. Como podemos tornar nossas empresas mais inovadoras? Nicola — Sabe o que acontece, de fato? O Brasil é um país muito fe- chado. É um dos países mais fecha- dos do mundo. A corrente de comér- cio com importação e exportação não dá 20% do PIB. Há pouco fluxo de pessoas. Quantos jornalistas estrangeiros há no país? Pouquís- simos. O Brasil é um país que não troca com o mundo. A inserção no mundo é o meio mais importante para receber, utilizar e aprender ideias novas. Há 500 anos, a China era o maior país do mundo e se iso- lou com a Grande Muralha. Portugal era um país que não tinha nada. O que ele fez? Pelas navegações, con- quistou um mundo novo. Portugal entrou num ciclo de progresso e de expansão. E a China entrou em decadência. O mundo está cheio de histórias de países que se fecham. O maior problema da Venezuela é estar fechada. O problema de Cuba é o mesmo. Na Argentina, também. Pior que o comunismo é ter um país fechado. O Brasil precisa conectar- se com o mundo. É preciso privile- giar a política externa por acordos bilaterais com grandes países para abrir esse mercado. Revista da ESPM —Nosso grande par- ceiro atualmente é a China. Será esse o caminho? Nicola — A resposta é complexa. A China é um grande parceiro, mas não o único. Nós não devemos ter preferências. O Brasil tem de se aproximar dos Estados Unidos, da Comunidade Europeia, do Japão, da Coreia. O governo deve fazer uma lis- ta de dez, doze parceiros, não se fixar só em alguns. Revista da ESPM — A McKinsey recentemente publicou um estudo des- tacando que o consumo será a grande força de expansão da América Latina nos próximos anos. No caso do Brasil, perdemos esse trunfo com a crise? Nicola — O consumo virá quando o país voltar a crescer, certamente. Os grandes impulsos para crescimen- to do consumo, na última década, foram dois: distribuição de renda e aumento de crédito. Mas agora não há espaço para ambos. O endivida- mento do consumidor é muito alto. Um caminho é os juros baixarem. Mas há um caminho muito simples para melhorar a renda e o consumo, que é combater a corrupção, a infor- malidade e a improdutividade. Revista da ESPM — No contato com seus clientes, o que mais preocupa as empresas na hora de estabelecer seus planos estratégicos? Nicola — Eu sinto que o mercado está com uma vontade danada de fazer dar certo. As empresas estão cansa- das da crise. É como ter um parente no hospital doente por muito tempo. No fim, vem aquele cansaço. Sinto que o pessoal quer virar a página. O que está faltando, agora, é uma agenda mais propositiva. O governo mandou para o Congresso a Proposta de Emenda Constitucional [PEC] do teto dos gastos públicos [que já foi aprovada na Câmara dos Depu- tados]. Vai mandar a reforma tra- balhista, a reforma da Previdência. Tem tudo para fazer acontecer. Nós ficamos muito tempo aproveitando as reformas de 15 anos atrás, emba- lados pelo boom das commodities. Agora, acabou esse espaço. Tem de fazer as reformas. Muitos poderão deixar a aposentadoria para um pouco mais tarde. Precisamos disso, senão a conta não fecha. Temos de considerar que o Brasil é o país dos benefícios adquiridos e das obriga- ções decrescentes. Os direitos são adquiridos e não se discute. E as obri- gações diminuem: semana de cinco dias, mais feriados e benefícios. Você não pode ter os benefícios da Europa com uma renda de África. De duas uma: ou aumenta a renda ou diminui o benefício. O Brasil é um dos países mais fechados do mundo. A corrente de comércio com importação e exportação não dá 20%do PIB. Há pouco fluxo de pessoas

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