RESPM SET-OUT 2016
entrevista | Samuel de Abreu Pessôa Revista da ESPM | setembro/outubrode 2016 16 Pessôa —Creio que sim. Ogrupo políti- co petista foi tão punido... A esquerda, mais que a direita, deveria se preo- cupar com a responsabilidade fiscal, porque o desequilíbrio fiscal leva à inflação, e a experiência sugere que, com inflação, quem se ferra é o pobre. Nunca vi rico se dar mal com inflação. Quemse dámal com inflação é omais desprotegido. É paradoxal que um partido de esquerda seja inflacionário. Mas continuam achando desculpas, não reconhecendooqueprovavelmen- te foi o pior regime de política econô- mica da história da República, entre 2009 e 2014. Nunca foram tomadas tantasmedidas erradas emsequência, de forma sistemática, em um curto intervalo de tempo e em tamanha profusão, oque gerouomaior desastre. Revista da ESPM — Voltando à ques- tão da Lei de Responsabilidade Fiscal... Pessôa — A esquerda não vai mais embarcar nesse tipo de irresponsabi- lidade fiscal. Revista da ESPM — Há um ano, você disse durante uma entrevista que estava bem pessimista com o futuro do país. E atualmente? Pessôa — Continuo muito pessimis- ta. A origem dos nossos gastos são programas que estão na lei. Há toda uma agenda de melhorar a eficiência, cortar desperdício, mas, grosso modo, tudo é muito legítimo. Bolsa Família é legítimo. Lei Orgânica da Assistência Social é legítimo. Minha Casa, Minha Vida é legítimo. O Fies [Fundo de Fi- nanciamento Estudantil] é legítimo. O Brasil é umpaís pobre e desigual. Ago- ra, o PT quis demonstrar um teorema que é: gasto legítimo tem orçamento. Infelizmente, esse teorema não é verdadeiro. Arrumar a casa agora vai doer muito. Cortes terão de ser feitos e isto não é uma coisa simples. Vai machucar. E eu tenho dúvidas sobre se a nossa política vai conseguir digerir todas as transformações. O problema se acumulou. Em 2005, teria enfren- tado essa situação com tranquilidade. Ajustar agora é custoso. Revista da ESPM — O reaquecimento da economia e da arrecadação não aju- da a reequilibrar? Pessôa — São R$ 170 bilhões de deficit neste ano. Isso não vai acabar. É es- trutural. Quando a economia voltar a crescer, a receita não virá forte. A receita que cobria os gastos no passa- do estava associada a um processo de formalização da mão de obra que não voltará a acontecer. Revista da ESPM — Certa vez, você disse que “o nó brasileiro hoje não é a corrupção, mas o Estado”. Por quê? Pessôa — Quando olho para o Estado, mais especificamente para a União, o problema, essencialmente, é o estado de bem-estar social. É um conjunto de regras que criamos, que vem lá da Constituição, mas não é só da Cons- tituição. Coisas que fazem sentido, como regras para aumento do salário mínimo ou o piso da previdência ser o salário mínimo. Para cada holerite de coronel da Polícia Militar, há 30 na inatividade. Não tem receita, não tem Estado que fique de pé. É preciso redesenhar isso, para que gere um crescimento do gasto que fique den- tro da capacidade do Estado. OEstado tem de voltar a caber dentro dele. Fa- zer isso vai doer muito. É uma agenda duríssima, porque por trás de cada ponto há interesses. shutterstock OBrasil éumpaíspobreedesigual. Agora, oPTquisdemonstrar umteoremaqueé: gasto legítimo temorçamento. Infelizmente, esse teoremanãoéverdadeiro
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