RESPM ABR_MAI_JUN 2017

Tendências Revista da ESPM | abril/maio/junhode 2017 62 novos tipos de capital, que podem ajudar a explicar as recentes transformações de consumo. Unclassed Behaviour: consumo deixa de ser condicionado unicamente por renda A Box1824 mapeou, em inúmeros estudos dos últimos anos, que consumidores de diferentes classes sociais e níveis de renda passaram a desafiar o pressuposto top- down largamente difundido em estudos de mercado, segundo o qual o “aspiracional” seria sempre o código das classes sociais mais altas. A combinação entre aumento de renda, maior esco- laridade e inserção digital das classes mais baixas cul- minou em um contexto no qual pessoas que antes cir- culavamapenas pelas margens da sociedade passaram a transitar pelos centros e tornaram-se influenciadoras de comportamento. Por meio da rede, essas pessoas se empoderaram para mobilizar seu capital cultural em novos espaços: ganharamrepresentatividade e dissemi- naram suas ideias, expressões culturais e códigos esté- ticos — que passarama influenciar o comportamento de todas as classes. Alémdisso, fenômenos de apropriação das cidades e emergência de espaços públicos compar- tilhados por pessoas de todas as origens criaram espa- ços físicos de trocas culturais cada vez mais intensas. Como consequência, expressões advindas das perife- rias tornaram-se referências para pessoas de todas as faixas de renda e elementos antes exclusivos de classes altas foramdemocratizados e passaram a ser consumi- dos por amplas faixas da população. Assim, narrativas construídas em todas as clas- ses ganharam visibilidade pública e, embora a renda continue sendo um critério importante para se anali- sar o consumo, não é mais o único fator de desejo. A partir dessas tendências, muitas marcas passaram a beber dessas misturas de referências para construir seus posicionamentos, resultando num cenário mer- cadológico em que nem sempre a mais cara se torna a mais aspiracional. Lowsumerism : a opção por padrões de consumo mais conscientes Outra tendência comportamental mapeada pela Box1824, que impacta o consumo de todas as classes, intitula-se lowsumerism , expressão cunhada a partir da junção das palavras low (baixo) e consumerism (consumo). Seu pressuposto é de que vivemos em uma cultura que transformou tudo em excesso e qualquer bem (mate- rial ou simbólico) se torna passível de ser comprado e descartado. Como reação, as pessoas já conectam essa lógica a endividamento por crédito, esgotamento de matérias-primas domundo, processos de produção que não respeitam leis trabalhistas e a sustentabilidade de recursos naturais em busca de maximização de lucros, assim como sérias consequências decorrentes dos des- cartes no meio ambiente. A lógica de “você é o que você consome”, tão exaltada por muitas marcas nas últimas décadas, chegou a um estado de saturação. Diante desse cenário, uma nova consciência de con- sumo emerge e é potencializada pelomomento de crise: passa-se a questionar todo tipo de consumo, centra-se no essencial. A ideia de que o uso de um bem é mais importante do que sua posse é fortalecida e buscam- se alternativas a categorias e marcas consideradas nocivas ao meio ambiente e à sociedade. A partir da rede, da economia compartilhada e da proliferação de produtores alternativos à grande indústria, emergem novas expressões de consumo: alternativas de mobili- dade urbana ao carro, feiras de produção local, hortas comunitárias, grupos de escambo on-line, entre outras. Essa lógica impacta segmentos variados demercado, até a categoria de bens de luxo. Face aos valores do mundo contemporâneo, esses bens continuam sendo produzidos e comprados, mas ganha força a ideia de que o luxo temmenos a ver com o acúmulo de muitos bens caros, e sim com a escolha precisa de poucos e bons produtos, que comuniquem conexão com valo- res alinhados a uma nova consciência de consumo. Desse modo, o consumo ganha outros significados e leva ao reexame de escolhas por um viés ideológico. Hoje, esses comportamentos ainda são emergentes, mas, sendo cada vez mais adotados pelas novas gera- ções, tendem a influenciar novas configurações do mercado de consumo para todas as classes sociais. O contexto atual sinaliza que quedas no consumo de bens e categorias de mercado tradicionais são Asmarcas passarama construir posicionamentos, numcenário emque nemsempre o produtomais caro é omais aspiracional

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