RESPM JUL_AGO_SET 2017

julho/agosto/setembrode 2017| RevistadaESPM 51 Barbosa — Se você pegar o período da eleição do presidente Mauricio Macri e da mudança de governo até 2019, Brasil e Argentina estão fa- lando a mesma linguagem. Durante muitos anos, havia uma desconexão entre os dois países. Para uma série de medidas protecionistas, o Brasil adotou a política da paciência estra- tégica com a Argentina — indo contra os nossos interesses —, e agora pare- ce que adotamos uma nova agenda de fortalecimento do Mercosul. Há mais de 80 pontos de protecionismo dentro do Mercosul que estão sendo discutidos para aumentar a eficá- cia. Quer dizer, o Mercosul voltou a andar. Mas vai depender da eleição de 2018 no Brasil. Dependendo do resultado aqui, existe o risco de tudo desandar de novo. Revista da ESPM — E vai depender da sobrevivência política do próprioMacri. Barbosa —A Cristina Kirchner vai se candidatar mais para obter um cargo eletivo que lhe garanta fórumprivile- giado, mas não vejo grande ameaça ao governo. O problema do Macri é que, ao contrário do Brasil, a Argenti- na ainda vive com a sombra do pero- nismo depois de 60 anos, que reforça muito o papel dos sindicatos. Mas vejo que a Argentina está decidida, voltando ao iníciodanossa conversa, a finalmente abraçar a globalização. Revista da ESPM — A exportação de veículos no primeiro semestre de 2017 cresceu 14% em relação ao ano passado graças a três mercados: Argentina, Chile e México. Estamos recuperando nosso fôlego exportador e esses números mos- tram que a nossa indústria pode ter um papel na região alémdoMercosul? Barbosa —Nos últimos 15 anos e, con- tinuandoagora comessa crisepolítica, o Brasil perdeu a sua voz. Nós tínha- mos que assumir a liderançana região. Isso significa apresentar propostas, apontar soluções. A integração comer- cial na América Latina é de 16%. Na Europa, 60%. O que precisamos fazer para aumentar o comércio? O Brasil tem um imenso mercado interno e já pratica as melhores tarifas para os seus vizinhos. Países como o México e a Colômbia não oferecemasmesmas facilidades que nós. O Brasil deveria estudar uma forma de fortalecer o comércio e buscar nichos na região em que pudéssemos criar cadeias de pro- dução global, que é uma tendênciamo- derna da globalização. Nós estamos fora disso e está faltando uma visão clara de médio e longo prazos em que todospodemosnosbeneficiar. OBrasil hoje possui superávit comercial com todos os países, exceto a Bolívia, por causa do gás natural. Mas não temos uma visão estratégica para a região. Revista da ESPM — Não temos canais de diálogo aberto com os principais paí- ses da região? Barbosa — Em relação ao México, nós queremos um acordo, mas eles resistem por receio de que os nossos empresários sejam muito agressi- vos. Então é curioso que muitos des- ses países, como o México e o Chile, façam acordo de livre comércio com os Estados Unidos, mas não façam com a gente. Isso vem de fatores his- tóricos. Em 2019, se todos os acordos da Associação Latino-americana de Integração [Aladi] forem cumpri- dos, nós teremos uma zona de livre comércio na região. Mas o que as nossas empresas e os nossos acadê- micos estão pensando sobre isso? A crise política nos deixou parali- sados. Por isso, eu creio que a elei- ção do ano que vem possa ser uma grande oportunidade para levantar essas discussões. O que vamos fazer da política industrial? Do comércio exterior? Do papel do Estado? Nós corremos um risco sério de ficar- mos para trás. Os países andinos já firmaram acordos com os Estados Unidos, a Coreia e a China. E nós continuamos dando tarifa zero de importação para esses países. Desse jeito, em pouco tempo haverá indús- trias chinesas e coreanas se insta- lando nesses países para vender ao Brasil. Há toda uma agenda para ser discutida e vejo pouca gente preocu- pada com isso. Esse é um problema que vai estourar lá na frente, dentro de uns quatro ou cinco anos. E nós estamos perdendo espaço em todas essas áreas. Revista da ESPM — Os tucanos volta- ram ao comando das Relações Exteriores depois do longo ciclo de governo do PT. Como o senhor avalia essa retomada? Os ministros do PSDB estão sendo muito tímidos no que se refere às questões do comércio exterior? Os países desenvolvidos não queremnegociar pela OMC, porque lá a regra é o consenso. E como pode haver consenso quando você temVenezuela, Cuba e Bolívia, que não permitem isso?

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