Revista da ESPM
ENTREVISTA | EDUARDO GIANNETTI DA FONSECA REVISTA DA ESPM | JULHO/AGOSTO/SETEMBRODE 2018 18 Giannetti — A educação tem de ensinar para a vida, em todos os aspectos. Não é só centralmente para a economia. É para a v ida pessoal. Para a pessoa se tornar melhor para a existência. Viver de forma consequente com o sonho que possa ter. A grande missão do professor é despertar a paixão pelo conhecimento. Se isso aconte- ce, o retorno vem por consequência. A pessoa tem de descobrir como é bom, como enriquece a existência humana essa curiosidade que leva à busca do conhecimento onde ele está. É preciso fazer isso de ma- neira analítica, estruturada. Por- que não adianta nada uma curio- sidade totalmente superficial. Eu acho muito denso esse sentido do aprendizado. Requer-se modelo de educação de capacitação de vida plena, com dimensão econô- mica, mas que não se reduz a ela. A pessoa descobre seus valores, o sonho de que é portadora, a ma- neira para alcançá-lo, ciente de que isso não é necessariamente possível. Revista da ESPM — Alguns econo- mistas de pensamento liberal estão falando abertamente em cobrar o ensino superior público. No Brasil, esse é um tema tão dogmático quanto debater a privatização da Petrobras. Estamos preparados para encarar alguns debates, como o dos custos da educação superior? Giannetti — Precisamos ter certo cuidado. Ninguém pode deixar de fazer um curso universitário públi- co por falta de recursos próprios. Por outro lado, nós gastamos de maneira desmesurada o orçamento em educação para os ricos, o gasto é regressivo. Não é justo nem efi- ciente que os ricos capturem o filé mignon no ensino superior público. Inclusive cito Karl Marx, que fala- va da injustiça do ensino superior público gratuito. Diz textualmente que os ricos agora vão financiar sua educação com recursos públicos. Revista da ESPM — Qual a sua visão sobre o ensino secundário téc- nico, que está bem abaixo da média internacional? Giannetti — Outra chaga é o bacha- relismo. Achar que para ter uma boa formação é preciso fazer uma facul- dade e ter um diploma. O Inaf, que é o índice nacional de analfabetismo funcional, constata que um terço dos alunos das faculdades brasilei- ras são analfabetos funcionais. No Brasil, produzem-se credenciais educacionais sem lastro. Precisa- mos entender que a boa formação não é necessariamente a de bacha- rel. Importante é ser bom no que faz. É ter capacidade de pensamento próprio. É ter curiosidade e ir atrás do conhecimento. E isso não passa necessariamente pelo ensino supe- rior, por um tipo de bacharelismo. Acho que foi muito irresponsável como se deu a expansão de matrí- culas no ensino superior brasileiro, sem ter cuidado com a qualidade e afrouxando-se os critérios de ad- missão e aprovação. Me assusta o número de desistências, durante o ano, de jovens de baixa renda, que gastam suas economias sem sequer completar o curso, abandonando no primeiro ou no segundo ano de formação superior. Revista da ESPM — Historicamente, prestar concurso e gozar a estabili- dade de um emprego público eram ambições altamente valorizadas em relação ao trabalho na iniciativa pri- vada. Estamos assistindo, porém, ao surgimento de uma geração com mais espírito empreendedor. Há consistên- cia nesse movimento? Giannetti — O Brasil tem mobi- lidade empreendedora vibrante. O problema é que as pessoas não estão preparadas para traduzir esse impulso empreendedor em negócio. Há dois aspectos a considerar. O pri- meiro, que já comentamos, é a falta de formação. Para você empreender de forma consequente, precisa de capacidade analítica, de avaliar o mercado, otimizar os custos e saber estruturar no tempo as escolhas. E isso nos falta por deficiência no sis- tema educacional. O outro aspecto é o ambiente de negócios extrema- mente nocivo ao empreendedor. Eu costumo dizer que se a Microsoft tivesse começado no Brasil num fundo de quintal, teria continuado até agora no quintal. E vendendo produto pirata. Nosso ambiente de negócios é altamente corrosivo. Ve- jamos o potencial de avanço de uma Para você empreender de forma consequente, precisa de capacidade analítica, de avaliar omercado, otimizar os custos e saber estruturar no tempo as escolhas. E isso nos faltapor deficiênciano sistema educacional
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