Revista da ESPM
ENTREVISTA | FÁBIO COLLETTI BARBOSA REVISTA DA ESPM | JULHO/AGOSTO/SETEMBRODE 2018 40 Revista da ESPM — Do ponto de vista da conjuntura, quais foram as razões que resultaram na atual crise? Vale lembrar que os dois mandatos de FHC e mesmo o primeiro mandato de Lula pre- nunciavam um crescimento sustentável da economia. Por que, de repente, tudo começou a piorar? Fábio Colletti Barbosa — O Brasil sempre oscila entre o grande entu- siasmo e o abismo. Esse movimento foi estampado até na capa de The Eco- nomist : a primeira, em 2009, mostrou o Cristo Redentor subindo como um foguete; e a outra, em 2013, trouxe o Cristo caindo como se o foguete “Bra- sil” não tivesse sido bem-sucedido. As duas capas estavam exageradas. Uma pecou pelo excesso de entusiasmo e a outra pelo negativismo. Mas o fato é que o Brasil foi muito favorecido pelo aumento no preço das commo- dities e conseguiu acompanhar o crescimento global até 2007, quando a economia reverteu e todos os países passaram a adotar uma política fis- cal mais frouxa. Dois anos depois, a maioria das nações parou de colocar dinheiro para estimular a economia, enquanto o Brasil tomou gosto pela coisa e continuou com a mesma polí- tica desenvolvimentista. Fornecendo benefícios fiscais e subsídios para determinadas áreas da economia, o Estado acabou esquecendo a rigidez fiscal que foi tão importante nos pri- meiros anos do governo Lula. Na era Dilma, essa política não só prevaleceu como foi implantada a filosofia de que em país pobre o Estado tem de gastar mais e não menos. Se esta tese fosse verdadeira, não haveria pobreza nem naÁfrica nemno Brasil. Revista da ESPM — Até que o Estado passou dos limites, a conta chegou e o dinheiro acabou… Fábio — Em 2013, quando o dinheiro acabou, o governo pisou no freio e tra- vou a economia. A euforia do cresci- mento suportado pelo Estado foi subs- tituída pela rigidez de parar de gastar, que culminou no impeachment da Dilma. A essa altura a inflação já esta- va subindo, assimcomo odesemprego e a taxa de juros, tudo consequência de umdesarranjo nas contas públicas. O governo brasileiro não soube parar na hora certa e acabou levando o país para umendividamento aindamaior. Revista da ESPM —O que deveríamos fazer para reverter o cenário atual? Fábio — Sou moderadamente otimis- ta, porque, nos dois últimos anos, começamos a pôr a casa em ordem e em 2018 a situação começa a me- lhorar. Agora, existe um consenso entre os economistas sobre qual é o problema mais urgente a ser resolvi- do no Brasil: as contas públicas. Há cinco anos, esse consenso simples- mente não existia porque as contas estavam relativamente em ordem e o crescimento do país colocava uma nuvem de poeira no problema. Agora, todos sabem que é preciso endereçar a questão das contas internas. Na campanha, todos os candidatos à pre- sidência da República irão abordar a questão da previdência, dos subsídios e da reforma tributária, emdiferentes intensidades, porque esses proble- mas terão de ser resolvidos. Como costumava dizer Winston Churchill, ex-primeiro ministro britânico: “O tempo da procrastinação e do adia- mento está acabando. Está chegando o tempo das consequências”. Ou seja, caso o problema das contas públicas não seja resolvido, teremos de enfren- tar as consequências. Revista da ESPM — Em relação às fa- mosas reformas que não saem do papel, o que o próximo presidente deverá consi- derar prioritário e como poderá garantir o apoio político no Congresso? Fábio — A prioridade é fazer a reforma da previdência, por ser um problema demográfico, aritmético, mapeado, dimensionável e inquestionável, cuja conta já não fecha. Hoje, um em cada dez brasileiros tem mais de 60 anos. Em 2060, esse número passará a ser umemcada três. Este é o nossomaior problema no curto prazo e é fácil de ser equacionável, só que é politica- mente complicado de ser resolvido. Estivemos muito próximos de apro- var essa reforma. Não fosse a crise po- lítica que vivemos desde maio do ano passado, ela já teria sido aprovada. O que precisamos é de um Congresso disposto a levar adiante essa medida que desagrada a alguns setores. Mas aqueles que têm responsabilidade com o futuro do país que vamos dei- xar para os nossos filhos já estão conscientizados. Agora, precisamos As projeçõesmostramque embreve o país não terá dinheiro nempara fazer investimento – o que já é praticamente o caso –, nempara cumprir suas obrigações comeducação, saúde e serviços públicos
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NDQ1MTcx