Revista da ESPM

ENTREVISTA | FÁBIO COLLETTI BARBOSA REVISTA DA ESPM | JULHO/AGOSTO/SETEMBRODE 2018 42 eu fico com o ditado chinês que diz: “Se cada um varrer a sua calçada, o país estará limpo!”. Revista da ESPM — No livro, Gian- netti cita que “somos bons de conversa (governar é conversar!), beiramos a genialidade na racionalização enge- nhosa dos nossos erros e fraquezas, mas somos desleixados no agir e ineptos no executar”. Como lidar com esse eterno paradoxo do brasileiro? Fábio — O exemplo vem da família, dos valores da escola, da imprensa... Temos de adotar tolerância zero para esses pequenos delitos, porque o Bra- sil é a somatória de todos os nossos atos. Outro dia fui comprar um ma- terial numa papelaria perto do meu escritório. Pedi uma nota fiscal e o vendedor me perguntou de qual valor. O rapaz só me fez essa pergunta por- que tem muita gente que pede nota com valor acima do gasto real para levar alguma vantagem na hora do reembolso do taxista, do médico e do dentista. Outro dia, um amigo disse ter ficado espantado com o seu mé- dico, que queria sonegar imposto ao fazer-lhe a seguinte proposta: R$ 350 reais a consulta com recibo e R$ 300 semrecibo. Oque omédico fez não foi sonegar e sim oferecer ao meu amigo a opção de sonegar. Afinal, quem vai economizar é o paciente, que irá receber o desconto de R$ 50 que se- riam pagos ao governo. Seja qual for a escolha do meu amigo, o médico terá seus R$ 300. Logo, cabe aomeu amigo a decisão de sonegar ou não o imposto do médico. Este exemplo ilustra bem como nós jogamos facilmente a culpa no outro. O brasileiro precisa apren- der a ser protagonista de sua própria vida e mais radical nessa questão de valores. Felizmente, a internet e a digitalização permitem que todos vejam o comportamento das pessoas e têm dificultado a vida daqueles que até então conseguiam se dar bem à sombra da sociedade. Revista da ESPM — Mas você vê so- lução para esse tipo de conduta muito presente na sociedade brasileira? Fábio — Acabei de fazer uma viagem para o Oriente Médio e voltei com a sensação de que os nossos proble- mas são autoinfligidos e podem ser resolvidos internamente. Há pro- blemas muito mais sérios mundo afora, como as tensões regionais, a seca e a falta de água potável, que não temos de enfrentar por aqui. Eu noto que se a minha geração não deixou um país melhor para os nossos filhos, deixou filhos melho- res para o nosso Brasil. São jovens que estão cada vez mais envolvidos com a vida pública e comprometidos em construir um mundo melhor. Eles têm uma consciência social, ambiental e ética que minha ge- ração não teve. Basta lembrar das brincadeiras que fazíamos antiga- mente com relação à questão social e ninguém se importava. Essa nova geração é mais indignada e não se conforma com a exclusão de parte da sociedade, seja por questão de raça, gênero ou orientação sexual. Há 20 anos, esse tipo de assunto simplesmente não fazia parte das discussões da sociedade. O mesmo ocorre com a questão ambiental, porque no passado sequer existia o conhecimento necessário para se pensar no assunto. yuganov konstantin / shutterstock . com Em1850, John Russell, primeiro-ministro inglês, proferiu a seguinte frase: ”Se vamos universalizar o voto, comecemos por educar o nosso povo”. Esta é a solução paramuitos dos problemas do Brasil

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