Revista da ESPM - OUT-NOV-DEZ_2018

OUTUBRO/NOVEMBRO/DEZEMBRODE 2018| REVISTADAESPM 89 E m julho de 2013, a Associação de Docentes da Universidade de Campinas (ADunicamp) montou um grupo de trabalho com o obje- tivo de estudar, para seus associados mais velhos, modelos demoradia diferentes daqueles dispo- nibilizados pelo mercado imobiliário emnossa região. A ideia surgiu face a um problema comum relatado por muitos associados, que mesmo depois de aposentados continuavammorando emcasas construídas para uma determinada fase da vida. Acontece que quando os filhos crescem e os proprietários entram na terceira idade, aquela moradia, que um dia foi uma ótima solu- ção arquitetônica, se torna um grande e perigoso pro- blema, com seus cômodos gigantes, muitas escadas e uma manutenção dispendiosa. À medida que a idade avança, notamos também que muitas pessoas começama se sentir solitárias e a valori- zar o fato de ter vizinhos para se relacionar, trocar expe- riências e pedir ajuda em caso de alguma emergência. Namaioria dos casos, entretanto, esse tipo de interação mostrava-se inviável devido à cultura da privacidade, valorizada na maioria dos empreendimentos imobiliá- rios, e à rotatividade dos vizinhos. Combasenessasdemandas, surgeoconceitode cohou- sing sênior, uma comunidade residencial inspirada em um conceito desenvolvido na Dinamarca, baseado nas experiências de comunidades hippies da década de 1960. Tal movimento é expresso emartigos como “Toda criança deve ter 100pais”, escrito em1967 pela jornalista Bodil Graae, que propunha o cuidado compartilhado de qualquer criança da comunidade quando seus pais esti- vessem trabalhando; e “O elo perdido entre a utopia e o modelo ultrapassado de residência isolada”, produzido em1968, pelo arquiteto JanGudmand-Hoyer. Estes dois artigos serviramdebaseparaacriaçãodeSaettedammen e Skraplanet, as duas primeiras comunidades cohousing multigeracionais dinamarquesas, inauguradas em1972, na região de Copenhague. Ainda assim, mais 15 anos se passaram até a inauguração de Midgarden, a primeira cohousing sênior projetada por e para idosos. A fórmula deu certo e, como início domilênio, a quan- tidadede cohousing s sênioresnaDinamarca cresceu rapi- damente, ultrapassando o número demultigeracionais e atingindo um total de 250 comunidades em 2015. Em comum, essesempreendimentos têmseiscaracterísticas: • Processoparticipativo: osmoradores participamda orga- nização, do planejamento e do projeto arquitetônico, assim como da administração e manutenção da comu- nidade constituída, e são responsáveis, como grupo, pelas decisões finais. • Projeto intencional de vizinhança: o projeto físico esti- mula um forte senso de comunidade. • Ampla gama de instalações comuns: as áreas de uso comum constituem-se emmeios de integração e conví- vio dos moradores. • Gerenciamento pelos moradores: a cohousing é geren- ciada pelosmoradores, que tomamdecisões de interesse comumnas reuniões comunitárias. • Estrutura não hierárquica: as responsabilidades pelas decisões são compartilhadas com todos os moradores. • Recursosfinanceirospessoaiseindependentes: a comuni- dade não é fonte de recursos financeiros para seusmora- dores que administramemantêmseus rendimentos de maneira independente. Tais características, muito presentes nesse tipo de moradia, têm um impacto direto na saúde, na longe- vidade e na qualidade de vida de seus moradores. Pes- quisas feitas pelo governo dinamarquês constataram o impacto positivo desse tipo de empreendimento nos gastos como sistemade saúde dopaís, decorrente do fato de moradores de cohousing sênior irem menos a médi- cos e consumirem menos medicamentos do que o res- tante da população. Notaramtambémque osmoradores dessas comunidades vivem, emmédia, oito anos amais do que a média da população, alémde registraremuma baixíssima incidência de demências senis e Alzheimer. Em 2015, o antropólogo dinamarquês Max Pedersen realizou uma grande pesquisa em comunidades cohou- sing sênior naDinamarca, na qual constatouque 98%dos moradores sentem-se seguros emsua comunidade; 95% satisfeitos comessa opção demoradia; e 70%declararam ter pelomenos quatro amigos entre seus vizinhos. Este número de amigos é considerado suficiente para garan- tir apoio e cuidado sempre que necessário.

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