Revista de Jornalismo ESPM
REVISTA DE JORNALISMO ESPM | CJR 35 são políticas, animadas e acalora- das – mas já incorporam a censura e a vigilância pelo Estado (na Rús- sia, a internet também é regida por umcapitalismo deEstado; platafor- mas comoLiveJournal eVKontakte hoje são controladas por oligarcas alinhados a Vladimir Putin). O segundo modelo alternativo é amídia de serviço público. AWiki- pédia, a notável enciclopédia cola- borativa, é um dos dez sites mais visitados do mundo. O orçamento anual da controladora da Wikipé- dia, a Wikimedia, foi de cerca de US$ 80 milhões em 2018 – embora tenha gastado apenas umquarto de 1% do que o Facebook desembol- sou naquele ano. Praticamente toda receita da Wikimedia vem de doa- ções, a maior parte em milhões de pequenas contribuições, e não em grandes desembolsos. Além disso, o modelo da Wikimedia é viabili- zado por milhões de horas de tra- balhodoadopor colaboradores, edi- tores e administradores. No entanto, reproduzir o sucesso da Wikipédia em outras ativida- des tem sido difícil. O Wikinotí- cias, um site de notícias editável e comconteúdode colaboradores, em geral se vê competindo com a irmã maior, poismuita notícia acaba apa- recendo emumverbete daWikipé- dia antes mesmo de chegar à reda- çãodaWikimedia. OWikilivros, que cria livros didáticos de conteúdo livre, e o Wikidata, que hospeda bancos de dados abertos, tiveram mais sucesso, mas não dominam uma categoria como acontece com aWikipédia. Dos cemmaiores sites do mundo, a Wikipédia é o único sem caráter comercial. Se a inter- net contemporânea é uma cidade, a Wikipédia é o único parque público; todo os demais espaços públicos são shopping centers: abertos ao público em geral, mas sujeitos às regras e à lógica do comércio. Durantemuito tempo, professores advertiamalunos a não citar aWiki- pédia, pois a informação encontrada ali não vinha de autoridades institu- cionais e o conteúdo podia ser redi- gido por qualquer um. Em outras palavras, podia ser “misinforma- tion”. Mas algo curioso ocorreu na década passada: ométodo daWiki- pédia de debater até produzir um consenso, permitindo que colabo- radores comopiniões distintas fos- semmodificando um texto até che- gar a um“ponto de vista neutro”, se provou incrivelmente durável. Em 2018, quando buscou informações imparciais sobre teorias da cons- piração para contextualizar vídeos polêmicos, oYouTube puxou textos de artigos daWikipédia. Na última década, a Wikipédia deixou de ser alvo de chacota por não ser confi- ável para se converter em uma das melhores definições atuais da rea- lidade de consenso. Embora seja verdade quemídias de serviço público, como aWikipé- dia, tenham de dividir espaço com empresas comerciais cada vezmais sofisticadas, tambémé verdade que preenchemuma lacunanomercado. Em1961, NewtMinow, que acabara de ser nomeado comissáriodaFede- ral Communications Commission, desafiou a associação de empresas radiodifusoras dos Estados Unidos, a National Association of Broad- casters, a assistir um dia inteiro da insípida programação de suas asso- ciadas. “Posso garantir que o que vocês verão é um vasto deserto”, declarou. Emvez de simplesmente limitar o entretenimento, Minow e seus sucessores buscaram preen- cher lacunas na programação edu- cativa, jornalística e cívica – áreas menosprezadas pelo mercado. No início da década de 1970, emisso- ras de TV e rádio de serviço público comoPBS eNPR já levavamprogra- mas como Vila Sésamo e All Things Considered ao público americano. A internet como um serviço públiconos levaapensaremserviços quenãoexistemhoje (pornão serem comercialmente viáveis), mas que talvez devessem existir para nosso benefício, para o benefício dos cida- dãos em uma democracia. Vimos uma onda de inovação envolvendo ferramentas que nos entreteem e atraemnossa atenção para revenda a anunciantes – mas muito menos inovação envolvendo ferramentas que nos instruem e nos desafiam a ampliar nossa esfera de exposição, ouque amplifiquemvozesmargina- lizadas. Umamídiadigital de serviço público taparia umburaco negro de desinformação commaterial educa- tivo e informações fidedignas. Não faz muito tempo, Donald Trump fez alusão a um estudo amplamentedesmentidopara lançar a absurda acusação de que oGoogle tinhamanipulado resultadosdebus-
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