Revista de Jornalismo ESPM
36 JANEIRO | JUNHO 2020 cas visando favorecer Hillary Clin- tonna eleiçãopara apresidênciados Estados Unidos em 2016. Embora o que Trump diga seja incorreto (e tenha circulado amplamente entre suamultidãode seguidores noTwit- ter, mostrando o pouco fiável que são redes sociais), há fatos descon- certantes por trás da afirmação. Um estudo do Facebook, feito em 2013, revelou que a plataforma pode, sim, influenciar o comparecimento às urnas. Quando um usuário da rede era notificado de que até seis ami- gos tinham votado, a probabilidade de que fosse votar era 0,39%maior do que entre quem não tinha visto ninguémvotar. Embora o efeito seja reduzido, JonathanZittrain, profes- sor de direito de Harvard, diz que até um empurrãozinho como esse poderia influenciar uma eleição, já que o Facebook poderia mobilizar um grupo de eleitores e outro, não. Facebook e Google também pode- riam influenciar resultados de elei- ções se suprimissem informações prejudiciais a umcandidato ou pro- movessem desproporcionalmente notícias positivas sobre um outro. Essa forma demanipulação seria ainda mais difícil de detectar do que a campanha de desinforma- ção da Rússia na eleição de 2016, pois as evidências não consistiriam de posts com incorreções, mas de diferenças sutis no rankeamento de postages paramilhões de usuários. Além disso, auditar sistemas para determinar se está havendo mani- pulação pode ser proibido por lei. Oprofessor de ciência da computa- çãoChristian Sandvig e uma equipe de acadêmicos estão movendo um processo contra o Departamento de Justiça americano pelo direito de investigar a discriminação racial em plataformas digitais – trabalho que poderia estar em conflito com a legislação de crimes cibernéticos americana (a Computer Fraud and Abuse Act), que impõe penalida- des severas a quem for julgado cul- pado de acessar umsistema como o Facebook ou o Google de maneira que “exceda o acesso autorizado”. Uma maneira de evitar um mundo em que o Google manipula uma eleição para presidente seria permitir que acadêmicos ou auto- ridades públicas auditassem regu- larmente o mecanismo de busca. Outra saída seria criar umbuscador de interesse público que já embu- tisse a auditoria. A ideia não é tão absurda quanto parece. De 2005 a 2013, o governo francês liderou umprojeto colaborativo, o Quaero, para criar ummecanismo de busca multimídia que catalogasse o patri- mônio cultural europeu. O projeto foi suspenso antes de poder fazer concorrência a plataformas como o Google, mas, se tivesse avançado, a legislação da União Europeia teria exigido umalto grau de transparên- cia. Em2015, aWikimedia começou a planejar umbuscador, oWikime- dia Knowledge Engine, para com- petir comsistemas como oWolfram Alpha e a Siri, que fazem uma aná- lise factual,movida adados, aoouvir uma pergunta. Um elemento cru- cial entre as metas do projeto era a auditabilidade (a ideia foi aban- donada quando gerou dissensão na comunidade da Wikimedia). Dá para imaginar um buscador mais transparente, por exemplo, em relação ao sistema que usa para mostrar certos sites antes de outros em resultados de busca, com um processo para questionar o ranking emcaso de divergências. Mais inte- ressante, porém, seria imaginar ser- viços e ferramentas que ainda não existem – e que nunca serão cria- dos por empresas voltadas ao lucro. Vejamos o caso demídias sociais. Estudos sugerem que essas plata- formas podemestar intensificando a polarização política, esgarçando vínculos sociais eprovocandoansie- dade e depressão. Critica-se o Face- bookpor criar “eco chambers” e “fil- tros ideológicos” nos quais o indiví- duo só encontra conteúdo – às vezes conteúdo incorreto – que reforça seus preconceitos. Adesinformação resultante é, emparte, culpa de seu modelo financeiro. Isso ocorre por- Precisamos de uma onda de inovação voltada a imaginar e a criar ferramentas cuja meta não seja atrair nossa atenção como consumidores, mas conectar e nos informar como cidadãos
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