Revista de Jornalismo ESPM

REVISTA DE JORNALISMO ESPM | CJR 63 leão serva é professor do curso de graduação em jornalismo da ESPM e diretor de jornalismo da TV Cultura-SP. É autor dos livros Jornalismo e Desinformação (Senac) e A Desintegração dos Jornais (Reflexão). Tormenta: o governo Bolsonaro , Thaís Oyama Cia das Letras, 2020 rante a campanha eleitoral, eu perguntei a ele se ele tinha medo do que podia acontecer se ganhasse. Ele pensou e dis- se: “Claro que eu tenho me- do, Thaís. Eu nem inglês falo”. ESPM – E as agressões dele aos outros poderes são prova de poder ou sinal de fraqueza diante do isolamento? Thaís – Bebiano estava obce- cado com a ideia de que o Bol- sonaro queria esticar a corda e romper tudo, provocar uma ruptura. Ele sempre atacou o Congresso, que considera um “bando de traidores, traman- do seu impeachment”; ago- ra ataca o STF. E ele joga no conflito, não é de recuar. O fa- to novo é que neste momen- to os militares dão sinais de que acreditam que o STF exa- gera, invade competências do Executivo. E nesse quadro, por mais fraco que esteja, o pre- sidente tem um argumento: o de que está reagindo a alguma coisa, a ataques do Supremo contra o Executivo. ■ REPRODUÇÃO LIVRO Como o Messias fez milagre na eleição presidencial de 2018 POR MAIS MESSIAS que se achasse, é bem provável que nem mesmo Jair Bolsonaro acreditasse que poderia ga- nhar a eleição presidencial de 2018. Prova disso é que chegou ao Planalto sem pla- nos concretos de governo, su- as principais promessas até hoje não ganharam corpo ou mesmo projeto e, ainda em 2020, dá provas diárias de improvisação. Mas as urnas reservaram a sorte grande para o candidato que tinha apenas um peque- no átimo diário na TV e vive- ra abaixo do radar da impren- sa nas últimas três décadas. Como foi possível algo tão surpreendente ocorrer com alguém que não cumpriu ne- nhuma das práticas que ga- rantiram a escolha dos elei- tos nos sete pleitos anteriores, desde a volta da democracia? Em outras palavras: “Por que Bolsonaro venceu?”. A questão faz o subtítulo do livro A Eleição Disruptiva , de Maurício Moura e Juliano Corbellini. Os dois são cientistas polí- ticos. Moura é o criador e do- no do Ideia Big Data, um insti- tuto de pesquisas de opinião pública com método inova- dor (usa redes sociais), com o qual consegue ouvir mui- tos milhares de eleitores e formar um retrato mais pre- A Eleição Disruptiva: Por que Bolsonaro venceu Maurício Moura e Juliano Corbellini, Editora Record tradicionais para se infor- mar, substituindo aquelas fontes mais velhas pelas mí- dias digitais, onde Jair Bolso- naro era rei. A leitura do livro a esta al- tura, dois anos depois do pe- ríodo eleitoral, permite tam- bém antecipar uma questão que fica subjacente: quanto tempo dura a disrupção que o livro aponta? E mais: de- pois de eleger-se com apoio nas redes sociais, é possível também governar com base apenas do apoio nelas? A volta da influência do Centrão no governo Bolsona- ro, no momento em que ele parece ter chegado ao esgo- tamento, na primeira meta- de do segundo ano de gover- no, sugere que as redes di- gitais foram poderosas para eleger, mas não são úteis pa- ra governar. Sobre essa questão, Mau- rício Moura relatou à Revista de Jornalismo ESPM : “Na mi- nha opinião, as redes sociais têm um limite, até pelo pró- prio viés cognitivo dos gru- pos que se formam em fun- ção de opiniões semelhan- tes. O presidente governa se comunicando essencialmen- te com a sua base. O fato de ter dificuldades de expandir a popularidade expõe as li- mitações das redes sociais para governar”. ■ ciso da opinião pública. Foi assim que, antes de todos os outros institutos, o Ideia apontou a consistência da po- sição de Bolsonaro já no iní- cio de 2018. O livro mostra que a sur- presa de muitos com a es- colha do Capitão se deve ao desconhecimento sobre o que estava acontecendo com a cabeça do eleitor: ele queria uma mudança radi- cal e, portanto, não elegeria ninguém reconhecido como membro do espectro políti- co tradicional; e uma imen- sa parcela da opinião públi- ca não usava mais os meios REPRODUÇÃO