Revista de Jornalismo ESPM
18 JULHO | DEZEMBRO 2020 por emily atkin na faculdade, aprendi commeus professores que o jornalismo tinha um papel fundamental na democracia, pois ajudava o eleitor a tomar decisões embasadas. Ser jornalista significava ter impacto. Daí que, quando saí em busca de trabalho e vi uma vaga para cobrir o clima, parecia a oportunidade perfeita para fazer diferença. A mudança climática era um problema solucionável, achava eu. Se levasse os fatos aos leitores, meu trabalho um dia se tornaria obsoleto e o planeta estaria a salvo. Comecei emnovembro de 2013 como repórter climática do site de notí- cias ThinkProgress . Minha primeira pauta foi sobre um potencial candi- dato a senador pelo Texas segundo o qual o aquecimento global era um castigo divino pelo aborto praticado por mulheres. Obviamente, era bes- teira; o sujeito era um imbecil, dos perigosos. Mas guardei essa opinião para mim. Tinha aprendido que, para ser uma boa repórter, devia evitar editorializar. Por isso, mantive o tomneutro. “Oúltimo relatório do Painel Intergovernamental sobreMudanças Climáticas confirmou ser ‘muito alta a probabilidade de quemais dametade da elevação da temperaturamédia da superfície global registrada’ tenha sido causada pela ação humana”, escrevi. E acrescentei: “O relatório não mencionou o aborto”. Nos dois anos seguintes, desmenti dezenas de inverdades sobre a questão climática, semnuncaemitir juízosobreaquelesquementiam. Expliquei estu- dos científicos horripilantes sem nunca declarar expressamente que eram horripilantes. Relatei injustiças ambientais cometidas por todomeupaís sem nuncadizer que as vítimasmereciamtratamentomelhor. Embora escrevesse para um público progressista, minha meta era soar neutra. Pronto, falei! Trabalhando na cobertura do clima, descobri que a revolta traz lucidez, persistência, audácia, memória e audiência! Mas, no fundo, nãoeraneutra. Por- que, na realidade, eu não queria que a mudança climática piorasse. Não queria ver gente sofrendo. Toda vez que calava, sentia que estava traindo o leitor. Em 2014, escrevi sobre um relatório da Organização Mundial de Meteorologia (OMM), segundo o qual o acúmulo de dióxido de car- bono na atmosfera vinha ocorrendo a umritmomuitomais acelerado do que previsto. Quando a concentra- SHUTTERSTOCK
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