Revista da ESPM JUL_AGO_SET 2020 web

JULHO/AGOSTO/SETEMBRODE 2020| REVISTADAESPM 47 O usuário que só pedia sua pizza de domingo, quando se viu isolado e trabalhando de casa, passou a pedir também o almoço da semana, a bebida da sexta-feira, a farmácia e a padaria shutterstock . com Este assunto não é novo. Meses antes da pandemia, a precarização já estava em pauta. Porém, o fato que a pandemia expôs commuita clareza é que nossa segu- rança e saúde dependem da coragem e/ou extrema necessidade de toda uma classe, que, se decidisse fazer o isolamento como sugerem as autoridades de saúde, inviabilizaria o isolamento de outra classe, de gente “rica”, que pode pagar para receber comida, farmácia oumercado emcasa. Se ainda não estámuito claro qual o nível de valorização será dado ao entregador nessa cadeia, uma coisa é certa: não será o de hoje. Vai prospe- rar neste cenário a empresa que situar o entregador no seu devido lugar de destaque, assumindo que o serviço não acontece sem ele e que nenhum acionista ansioso precisa estar acima de toda uma classe. Neste novo cenário, é preciso considerar a questão da sociedade em rede e a compreensão dos diversos papéis de ummesmo indivíduo no ecossistema. O que a lógica de ecossistema — típico do nosso tempo — nos ensina é que os diversos públicos de uma rede estão interconectados e que ummesmo indivíduo pode assu- mir mais de um papel neste sistema. É essa realidade que cria condições para que toda e qualquer injustiça seja exposta. Enquanto no passado o agentemais forte da cadeia — em geral as plataformas de delivery e seus acionistas — acabava por tomar as decisões e estabe- lecer a forma como as relações se dariam, utilizando, obviamente, seu próprio senso de justiça, hoje todos os agentes da cadeia podem — e devem, em prol do equi- líbrio — reivindicar suas condições mínimas e podem até receber apoio dos demais agentes do ecossistema. É como se vivêssemos hoje num estado de constante vigilância, emque umagente cuida do outro, pelo bem de todos. Pode até ter umar de romantismo, mas é tam- bémpragmático e utilitarista. Como aprendemos com EdwardO. Wilson em A conquista social da Terra , nossos genes altruístas são necessários para a vida em socie- dade e a perpetuação da nossa espécie. Como um sistema só funciona se cada agente cum- prir a sua parte, esse novo mundo exige das empresas máxima transparência e interesse genuíno emcompar- tilhar riqueza e desenvolver a cadeia. Se as soluções para as dificuldades que se apresen- tam no setor de delivery on-line ainda não parecem estar embaixo do nosso nariz, o que está muito evi- dente é que as empresas que não conseguirem fazer uma leitura rápida e precisa das grandes questões da sociedade e não reagirem rapidamente a elas vão perder preferência. Isso é um alerta para as empre- sas que já existem, mas também uma oportunidade para as que ainda vão surgir. O cenário de pandemia sensibilizou as pessoas e revelou injustiças invisí- veis até então. As pessoas estão cada vez mais preo- cupadas com o bem-estar coletivo. As empresas que não ajustarem seus negócios — ou produzirem novos modelos —, para que sejam justos e coloquem saúde, segurança e bem-estar social acima dos lucros indi- viduais, não vão conseguir ter a preferência do usu- ário. Que bom! Está mais do que na hora de vivermos um novo capitalismo. Igor Pinterich Publicitário, empreendedor digital e mentor da BrazilLab, hub de inovação que acelera soluções e conecta empreendedores com o poder público, e voluntário da ONG Base Colaborativa que atuou como consultor autônomo para empresas como eduK e iFood. Também foi colaborador do Update or Die e mentor do Founder Institute

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