Revista da ESPM

JANEIRO/FEVEREIRO/MARÇODE 2020| REVISTADAESPM 15 M uito temsido falado sobre a substituição do ser humano pelamáquina na era da Inteligência Artificial. O relatório Jobs lost, jobs gained: workforce transition in a time of automation , produzidopela consultoriaMcKinsey em2017, estima que entre 400milhões e 800milhões de empregos serão automatizados até 2030, dependendoda velocidade da adoção de automação possibilitada por novas tecnologias e pela inteligência artificial. Os analistas da McKinsey não estão sozinhos nessa avaliação. No artigo Humans should move toward taxing robots , publicadono iníciode2018, no jornal Global Times , o professor Cai Fang, vice-presidente da Academia Chi- nesa de Ciências Sociais, faz a seguinte afirmação: “Não é inteiramente fantástico supor que, sob o domínio dos robôs, oshumanos sejamobrigadosapedir comida, jáque não têmmais trabalho a fazer. E isto não é uma piada”. O filósofo israelense Yuval Noah Harari é outro pen- sador influente que compartilha esse olhar mais pessi- mista em relação ao impacto futuro dos robôs no mer- cado de trabalho. Para o autor de 21 lições para o século 21 (Companhia das Letras, 2018), o ser humano precisará se esforçarmuito para não se tornar irrelevante (Duarte, 2019). Harari está emboa companhia, coma afirmação do professor de ciências da computação Stuart Russell, durante uma palestra em2014: “Por fim, expliquei (à pla- teia) o significado da IA superinteligente da seguinte forma: ‘O sucesso seria o maior evento da história da humanidade... E, talvez, o último evento na história da humanidade’” — problema descrito posteriormente no livro Human compatible: AI and the problem of control (Viking — Penguin RandomHouse LLC, 2019). Diante de tantas polêmicas e falas alarmistas, é fácil perder de vista que, simultaneamente à revolução digi- tal, a competição por talento humano vem se tornando cada vez mais intensa e que os seres humanos conti- nuam em alta demanda pelas organizações. De fato, a necessidade de pessoas bem qualificadas é tão grande que empresas do porte do Google, por exemplo, defi- nem o recrutamento de novos talentos como uma das maiores responsabilidades da diretoria executiva. Essa situação deu origem a termos como “guerra por talen- tos”, “escassez de talentos” ou ainda “concorrência por talentos”. Este artigo explora essa faceta da compe- tição empresarial: a competição por pessoas. Afinal, tecnologia pode ser comprada, mas as pessoas preci- sam ser convencidas a permanecer nas empresas, e isso vem se tornando cada vez mais difícil. Pessoas são fundamentais Com tantas novidades na arena tecnológica surgindo a todo momento, muitos acabam por esquecer de que não há revolução digital sem a participação integral das pessoas. Como afirma o Boston Consulting Group (BCG) em um de seus estudos: “Não há transformação digital semuma transformação cultural” ( It’s not a digi- tal transformation without a digital culture , 2018). Neste artigo, os consultores Jim Hemerling, Julie Kilmann, Martin Danoesastro, Liza Stutts e Cailin Ahern apon- tam aomenos três fatores pelos quais a cultura organi- zacional e as pessoas são fundamentais na era digital: • 1. Sem o envolvimento dos colaboradores, a grande maioria dos projetos de inteligência artificial/transfor- mação digital não oferece retorno financeiro. Muitos fracassam totalmente e precisam ser abandonados. Embora seja difícil obter uma estatística confiável (por- que as empresas normalmente não gostamde divulgar seus fracassos), estima-se que até 85% dos projetos de Inteligência Artificial fracassem, como indica Chrissy Kidd no artigo Why does Gartner predict up to 85% of AI projects will “not deliver” for CIOs? . Segundo o Gartner Group, isso ocorre por três fatores principais: confu- são na mudança de processos estabelecidos; dados e informações de baixa qualidade, enviesados, inadequa- dos e pouco confiáveis; e falta de competência interna (profissionais capacitados) para lidar com as tecnolo- gias de IA. Diante desse cenário, não são somente os projetos de IA que fracassam. Iniciativas mais amplas, que visam à transformação digital da empresa tam- bém dependem fundamentalmente do envolvimento das pessoas qualificadas para atingir seus objetivos. Voltando ao estudo conduzido pelo Boston Consul- ting Group (BCG), em uma amostra de 40 empresas que passaram por projetos de transformação digital, resultados positivos e sustentáveis por ao menos três anos após a implantação do projeto foram reportados somente por empresas que explicitamente (e estrate- gicamente) realizaram um processo de mudança cul- tural em paralelo ao projeto de transformação digital.

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