Revista da ESPM

JANEIRO/FEVEREIRO/MARÇODE 2020| REVISTADAESPM 43 N a fábrica da Airbus de Hamburgo, na Ale- manha, a linha de produção das asas do A350XWB — um jato comercial para 350 passageiros — é operada por apenas dois funcionários. Eles garantem o funcionamento de uma grande “cabeça de impressão”, do tamanho de umamesa de jantar. Em movimentos de vai e vem, ela deposita diversas camadas de fibra de carbono, umas sobre as outras, dando forma às asas da aeronave. A tecnologia permite esculpir asas com quase 30 metros de compri- mento, fortes, flexíveis e extremamente eficientes aero- dinamicamente empouco tempo. Quando a primeira etapa é finalizada, umdos opera- dores leva a asa e a base que a sustenta até a um forno autoclave. Nesse deslocamento não são necessários tratores ou empilhadeiras. A base que recebeu a asa também é um veículo de carga. Tem motores elétricos e dezenas de rodas compneus incomuns, que lembram os de veículos lunares, com rolamentos instalados na banda de rodagem, dando à estrutura a capacidade de realizar movimentos emqualquer direção. O comando de todo este sistema é feito por um controle remoto tão simples quanto o de um aeromodelo. O uso da fibra de carbono e de outras tecnologias tornou o processo de construção de aeronaves mais simples, eficiente e, aomesmo tempo, aindamais com- plexo. A linha de produção clean tempouco de fábrica e muito de laboratório. Com a tecnologia anterior, have- ria a necessidade demais pessoas, peças e ferramentas. O estado da arte na fabricação de aviões e seus compo- nentes antecipa um futuro cada vez mais próximo, no qual a alta tecnologia ameaça tornar obsoleta uma parte expressiva do trabalho humano. Podemos não saber exatamente como será este futuro, mas os primeiros traços da sociedade das pró- ximas décadas estão sendo desenhados diante de nos- sos olhos. Dos robôs (cada vez mais presentes) à Inte- ligência Artificial, passando por Machine Learning , Big Data , processamento e análise de dados em larga escala, rumamos para uma drástica transformação no modo de vida das pessoas e na sua relação com o tra- balho. A principal voz da atualidade no debate sobre as consequências do avanço exponencial da tecnologia é o historiador israelense Yuval Noah Harari. Autordos best-sellersSapiens: umabrevehistóriadahuma- nidade , Homo Deus e 21 Questões para o Século 21 , Harari desenha um futuro emque a obsolescência humana irá gerar uma massa de inúteis que precisarão ser susten- tados direta ou indiretamente por aqueles que, a duras penas, semanterãonecessários nomercadode trabalho. Pode parecer um pouco radical, mas os fatos apon- tampara umprocesso de extinção de postos de trabalho manuais e para a criação de cargos ocupados por uma combinação entre poucos humanos, muitas máquinas e milhares de algoritmos. Se a cada geração a tecnologia enviar para casa, de maneira definitiva, massas de trabalhadores que não conseguirão semanter aptos para os novos desafios do trabalho, alguém terá de administrar esse problema. A chance de a conta recair sobre governos e os cofres de seus tesouros é grande, e isso sairá bem caro. O papel da educação Da forma como as coisas estão evoluindo, a educação terá um papel importantíssimo na definição da escala desse problema. Quantomais emelhor educado for esse cidadão, menos exposto ao risco de se tornar obsoleto e economicamente inútil ele estará! O problema é que a qualidade da educação namaioria dos países não evi- tará que as pessoas convivam com o fantasma da falta de trabalho. E não falo daqueles que estudaram pouco tempo, mas sim de quem estudou mal. No Brasil, uma multidão está como futuro comprometido desde já. De acordo com o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), 50%dos alunos do país apresentaram o nível mais baixo de conhecimento em leitura, 55% em ciências e 68% emmatemática. Isso significa que essas pessoas têmconhecimentos rudimentares daquilo que lhes permitiria aprender de forma autônoma e a desen- volver o pensamento investigativo e lógico. Mesmo os vencedores dessa corrida de obstáculos não estarão seguros. É o caso do Luiz, um motorista que trabalha por meio de aplicativo na Grande São Paulo. O acesso ao financiamento estudantil o levou à faculdade e o lançou numa jornada para se tornar engenheiromeca- trônico. Porém, perto da formatura, faltava-lhe ainda um estágio. Como não falava inglês, não foi chamado nem para entrevistas.

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