Revista de Jornalismo ESPM

28 JANEIRO | JUNHO 2021 cil no modelo do Substack, que não premia o trabalho feito lentamente e publicado esporadicamente. OSubstackjátomoualgumasmedi- daspararesolveresseproblema.Parte do capital arrecadado está sendo usada para dar auxílio financeiro aos autores de certas newsletters. Isso inclui pequenos repasses sem nenhuma condição, adiantamentos deUS$ 25mil e “bolsas” deUS$ 100 mil.ComoprogramaSubstackDefen- der, lançadoemjulho, quemtemassi- naturas pagas pode se cadastrar para receber apoio jurídico terceirizado. Àépoca, os fundadores prometeram maisnovidades: “Faremosumgrande investimento em um programa de serviços com iniciativas relaciona- das a saúde, finanças pessoais, edi- ção, distribuição, design e espaços decoworking”, prevêMcKenzie, que lançouumpilotoparaconectar auto- rescomeditoreseassistênciamédica. “Para manter um ecossistema sau- dável para escritores e jornalistas a solução não é um belo CMS ou blo- ckchain ou qualquer outra firula. É toda a estrutura de apoio”, assegura. Por considerar o apoio comercial insuficiente,umpunhadodenewslet- ters já vem criando sua própria ver- são de redação, usando o Substack basicamente como plataforma para publicar (caso da The Dispatch, por exemplo). “OSubstacknãoéalgoque vá criar uma fase seguinte sustentá- vel, mas pode abrir a porta para situ- ações para as quais ainda não há por- tas”,analisaNathanSchneider,profes- sordeestudosdemídiadaUniversity ofColorado(Boulder).Namedidaem que vemreparar algo na indústria do jornalismo, oSubstackpodeser com- paradoaoGoFundMe:ummecanismo de sobrevivência cujos recursos são distribuídosde formadesigual earbi- trária, expondo problemas sistêmi- cos semenfrentá-losdiretamente. “O GoFundMe pode nos ajudar a enxer- gar coisas que não víamos, a colocar dinheiro onde ele não iria”, observa Schneider. “Mas, ninguémquer uma sociedade GoFundMe.” Em conversas com gente que publica no Substack, a maioria me dissequenãodavaparaviver sódisso; aindaprecisavampegar bicos, outros trabalhos. A maior parte da renda de Peck, por exemplo, vem de frilas e palestras; ela só consegue se man- ter sem um emprego fixo graças ao apoio do companheiro. HáquemuseoSubstackparapro- moveroutrosprojetosnosquaistraba- lha. Alguns usamoespaçopara fazer o que dá na telha (como Ellie She- chet e seu Horrible Lists, com títu- los como “How to give up on your dreamofmovinghome tobecomean herb farmer in 11 easy steps”, oualgo como “Como abandonar o sonho de ir morar no interior para virar pro- dutor de hortaliças em 11 simples passos”). O autor J.P. Brammer, que levou sua popular coluna de conse- lhos ¡Hola Papi! de uma revista para outra antes de chegar ao Substack, chama oespaçode sua “aposentado- riadamídia queer ”. Quandonão está fazendo a newsletter, Brammer ter- minade escrever umlivrodememó- rias. E gosta do Substack pelo que é. “Senãohouvesseinundação,ninguém precisaria erguer diques”, raciocina. “Ninguém vem e diz: ‘Ai, adoro esse dique’.Mas éumacoisaqueépreciso fazer para poder sobreviver.” Se entrar no sitedoSubstack, você verá umplacar – um “leaderboard” – com as 25 maiores newsletters pagas e gratuitas; o nome dos auto- res é acompanhado do avatarzinho circular do boletim de cada um. A intenção é afirmativa: mostrar que no Substack você, também, pode chegar lá. Mas, ao conferir essas lis- tas, algo salta à vista: quem fazmais sucesso no Substack é justamente o povoque já tinha umlugar ao sol nas tradicionais estruturas de poder da mídia. Amaioria é branca e homem; vários são conservadores:Matt Tai- bbi, Andrew Sullivan e Glenn Gre- enwad – os três comdiscurso pare- cidos sobre os males da cultura do cancelamento e da esquerda – estão entre os dez primeiros da lista. Nada disso chega a surpreender. É difícil receber quatro emojis de fogo sem trazer na bagagem a reputação adquirida eminstituições estabeleci- das. E, como o ativismo antirracista dos últimos anos escancarou ainda mais, essas instituições foram erigi- das sobre sistemas discriminatórios quedãoorigemaambientesde traba- “Escrever costuma ser uma atividade individualista, mas o jornalismo é uma empreitada coletiva. E esse é o paradoxo do Substack: é uma maneira de escapar de uma redação, mas é um desgarre completo”

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