Revista de Jornalismo ESPM

44 JANEIRO | JUNHO 2021 disse um psicólogo: “Hoje, somos todos o ‘BBC dad’.” “Inevitavelmente,nomeiodospre- parativos para nossa grande entre- vista às 7 damanhã, meumenino de seis anos aparece pedindo algo para comer ouumcolinho”, contaRachel Martin, apresentadora de dois pro- gramas naNPR, Up First eMorning Edition. “E isso namelhor das hipó- teses.” Apior é as crianças brigando na cozinha, que fica bem acima de um porão que era quarto de hóspe- des e que Martin converteu em um estúdiocaseiro, comoruídoentrando diretamente pelo duto de ventila- ção. Que os ouvintes não tenham reclamado da qualidade do áudio é um “milagre”, diz Martin, já que seu isolamento acústico se limita a “um monte de almofadas cobrindo as janelas” e “ummonte de coberto- res ao redor domeu corpo”.Martin, assimcomoUsher, está preocupada com a incapacidade de repórteres de cobrir fatos em campo e, sobre- tudopara a turmado rádio, comuma certa falta de espontaneidade no ar. “Antes, havia uma certa liberdade: ‘Quero ficar um minuto mais com este convidado’ ou ‘Vamos parar por aqui’”, explica, emendando: “Não dá mais para criar esses momentos”. Pamela Paul, editora da NewYork Times Book Review , tambémteve de se adaptar. Diferentemente do res- tante da redação, com seu foco no digital, o suplemento literário está “tão longe de dispensar o papel” que o jornal chegou a gastar US$ 20mil para reforçar o piso da seção para que suportasse o peso de todas as estantes deslizantes usadas para armazenar livros. “Nosso trabalho temum aspecto visual que não tem a ver com julgar o livro pela capa, mas comobservar os livros emcon- juntoeemagrupamentosquepermi- tem fazer certas associações e pen- sar empautas”, argumenta. “Traba- lhar de casa inibe, de certomodo, o inesperado e a criatividade.” Uma semana depois de o jornal fechar a sede, em março de 2020, Paul foi avisada de que havia correspondên- cia a sua espera. Ao encarregado, a editora pediu que deixasse tudo em uma salinha trancada a chave. Ouviu, de volta, que eram 167 cai- xas. Agora, ela aparece de vez em quando para distribuir o material pelas mesas vazias. Não há como levar tudo para casa. AnupKaphle, editor-chefe do jor- nal nepalês Kathmandu Post , rece- beu um telefonema inesperado no fimdo ano passado. Quem ligava era Sophie Schmidt, filha do ex-presi- dente doGoogle, Eric Schmidt, para saber se Kaphle gostaria de ser o editor-executivo de um novo pro- jeto no qual ela estava investindo, uma revista digital que publicaria grandes reportagens sobre tecnolo- gia de países sub-representados. A revista seria chamada Rest ofWorld , ou “restodomundo”. “Comoalguém que vem da região, achei muito interessante”, disse Kaphle. “Ser capaz de fazer esse tipo de repor- tagem sem impor um olhar oci- dental e permitir que essas visões e perspectivas locais se manifes- tem.” Emmeados de fevereiro, com o mundo prestes a mudar, Kaphle, 36, chegou aNova York. Suamulher estava na reta final da gravidez do primeiro filho do casal, esperado para março – mesmo mês para o qual estava programado o lança- mentoda Rest ofWorld . “Sóumades- sas coisas aconteceu na hora espe- rada”, lembra Kaphle. Uma semana após a mudança, Nova York decre- tou quarentena. Kaphle terminou fazendo teleconferências da mesa de jantar de um apartamento alu- gado em Long Island City, fitando “a silhueta [de Manhattan] e o rio e o que parecia ser uma Nova York muito tranquila, comsons de ambu- lância e caos.” A Rest of World foi lançada em maio, um momento difícil para qualquer redação –salvo pelo fato de que a Rest of World nunca foi pensada para funcionar como uma. Havia um escritório emNova York para abrigar editores-executivos, como Kaphle, e o pessoal de design e produção. A maioria dos repór- Em2018, cercade 3%dos americanos usavamesquemas de teletrabalho emtempo integral; hoje, são42%. Uma forçade trabalho semescritório promete ser uma característicadefinidorada vidapós-pandemia

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