Revista de Jornalismo ESPM

REVISTA DE JORNALISMO ESPM | CJR 23 santepara iraquianos, enãonecessariamenteparaumpúblicoamericano. Outro tema comum em minhas conversas com stringers foi aenorme desconfiança, fruto domedo, que os iraquianos sentem uns pelos outros atualmente. Certa noite, enquanto conversávamos na sala de estar da sede fortificada do meio para o qual trabalha,Yousif contoudodiaemque cruzou com um amigo na Universidade de Bagdá enquanto acompanhavaumrepórter americano. Como seuamigo achaque ele trabalhapara uma empresa de informática, Yousif foi logo inventandoqueestava lápara intermediarumacordopara fornecer computadores à universidade. “Não colou”, disseYousif comuma risada, “mas, como ele não viu o jornalista, mesafei”.Oamigo, explicou, achaque jornalistas são espiões dos americanos. “Os iraquianos sempre acham queháumaconspiraçãocontraeles.” Críticos da coberturada imprensa daguerranoIraquevoltaemeiareclamamquejornalistasamericanosestão obcecados em dar “notícias ruins”, ignorandoas “boas”. Paramuitosdos iraquianosque trabalhamparameios americanos, éalgoquesoairrelevante, até absurdo. Ahmed, umrapaz de ar circunspectode31anosquedavaaulas depoesia emumauniversidade local antes da guerra e hoje trabalha para uma rede de jornais americana, deu de ombros e disse: “Quando se tem umhotel sendo construído emNajaf e o sequestro de uma jornalista em Bagdá, fazer o quê? A notícia ruim atropela a notícia boa”. Assad,quetrabalhaparaumarevista americana, temumavisãoaindapior: “Nãohápaz,nãoháreconstrução,não háressurgimentosobreoqualescrever. Sóvi a reconstruçãodaZonaVerde, e issoéparaosamericanos”.Umsujeito cordial e realista, Assad era contador e professor de inglês antes da guerra, e já trabalhara para um punhado de meios europeus e americanos. Disse que gostaria de voltar a ser contador, de preferência, nos Estados Unidos, masque, porora, otrabalhocomo jornalista pagamais. Dos stringers iraquianos que conheci, Assad pode ser a exceção, pois nãovê seu futurono jornalismo. Apesar do perigo, do sigilo, do sentimento de frustração tanto diante da ocupaçãocaóticadosEstadosUnidos como do desejo de mais autonomia no trabalho, a maioria desses stringers pareciadecididaa seguirnaprofissão, aindaque isso significasse sair do Iraque. Yousif eAhmedmedisseramquepassarama ver o jornalismo como aúnicamaneirade contar corretamente a história de seu país, e ambos estão se candidatando a bolsas de jornalismo no exterior. Por ora, nenhumdeles considerariatrabalharparapublicações iraquianas, que nãopassamde porta-voz de grupos políticos ou religiosos específicos. Yousif disse que gostaria de lançar sua própria revista no Iraque, usando o que aprendeu com jornalistas estrangeiros. Ahmed temuma visão mais ampla: “Um jornalismo independente e objetivo pode promover a democracia e uma posição política sólida no Iraque. Se conseguirmos essas condições, trabalharia para uma publicação iraquiana”. Até Salih, que sai todos os dias sabendo que queremmatá-lo, disse que o jornalismo é sua única saída para ajudar o mundo a entender o que está acontecendo em seu país. Mas está desanimado como perigo e com a falta de interesse por parte de autoridades americanas e iraquianas em investigar o crime e a corrupção quepermeiamoIraquepós-guerra.Em umadeclaraçãosurpreendente, Salih disse que até sob Saddam, se um jornalista fizesse alguma acusação contra o governo, haveria uma investigação. “Antes,erapossívelescreversobre contrabando,digamos,masagoravocê podesermorto.Esseéo jeitocertode dizer a verdade neste país? As forças americanasestãoapoiandogentecomo JassamJabarae, quandosaemreportagens como aminha, nunca investigam, eessescarasestãoficandopiores – estão virando intocáveis.” ■ paul mcleary é repórter de defesa do Politico e cobre as notícias do Pentágono A Guerra do Iraque teve início em2003, como exército de GeorgeW. Bush invadindo o país para acabar como regime de SaddamHussein PHOTOGNOSOURCE/TNS/ZUMAPRESS / FOTOARENA KAREN BALLARD-POOL/ZUMAPRESS / FOTOARENA

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