Revista de Jornalismo ESPM

60 JANEIRO | JUNHO 2022 LIVROS O FUTURODAUCRÂNIA, DA RÚSSIA E DO JORNALISMODE GUERRA UMA SENSAÇÃO ESTRANHA DE DÉJÀ-VU costuma abater as pessoas quando se dão conta de que a primeira guerra coberta pelo jornalismo em toda a história aconteceu na Crimeia, exatamente onde começou a mais recente guerra europeia, cerca de 170 anos depois. Pior, a região esteve envolvida em pelo menos três outros conflitos semelhantes desde então. O problema não está nas guerras, certamente, mas no jornalismo contemporâneo, que tem como um componente essencial, seu “pecado original”, o desprezo pela dimensão histórica dos fatos. A esse tema, dediquei meu livro Jornalismo e Desinformação, que elenca também outras formas de engano provocadas pela técnica jornalística mesmo quando exercida com perfeição. Para conhecer melhor a história da cobertura da Guerra da Crimeia, início do longo e profundo relacionamento entre jornalismo e guerras, é sempre bom voltar a uma obra que marcou profundamente os estudos de jornalismo no mundo desde seu lançamento em 1975, a tal ponto que até mesmo quem nunca leu o livro certamente já ouviu uma referência ao seu título A Primeira Vítima (a edição brasileira está esgotada desde os anos 1970). Foi o autor Philip Knightley (1929-2016) quem pinçou para o título de sua obra a frase do senador americano Hiram Johnson (1866-1945), referindo-se ao início da participação dos EUA na Primeira Guerra Mundial, em 1917: “A primeira vítima quando vem a guerra é a verdade”. Knightley lançou sua história do jornalismo de guerra em 1975, coincidindo com o fim da participação norte-americana na Guerra do Vietnã. Tinha o subtítulo: O Correspondente como Herói e Criador de Mitos, da Crimeia ao Vietnã. Nas décadas seguintes ele fez novas edições ampliadas com capítulos sobre as Malvinas, a Guerra do Golfo e o Iraque. O livro é uma história do jornalismo de guerra, que começa na Crimeia. Antes, os “correspondentes” eram militares, enfermeiros, embaixadores ou cidadãos comuns que enviavam cartas para a imprensa. Foi o jornal britânico The Times que resolveu cobrir com um repórter profissional o conflito em que tropas da Inglaterra, da França e da Turquia, juntas, enfrentavam o exército russo, exatamente em uma disputa pela península no litoral da Ucrânia. Ler o livro permite o leitor entender como o conhecimento de história no jornalismo pode ajudar a prever o futuro. Não foi por outra razão que o jornalista americano John Reed (autor do clássico Dez Dias que Abalaram o Mundo, sobre a Revolução Soviética) previu, em seu livro sobre a Guerra dos Bálcãs (1912 e 1913), que o século 20 começou e terminaria com conflitos naquela região da Europa JORNALISMOE DESINFORMAÇÃO, de Leão Serva. Editora Senac, 2001 SHUTTERSTOCK PARA LER E PARA VER LEÃO SERVA

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