Revista da ESPM - 124

EDIÇÃO 124 | 2022 | REVISTADAESPM 37 democracia deve ser pautada por um equilíbrio (nem sempre facilmente equacionável) entre a “liberdade” e a “desigualdade” em uma sociedade. Não existe democracia semliberdade de manifestação, de opinião, de imprensa; em síntese, de comunicação das ideias. Todavia, isso não significa que o “direito de liberdade” seja um direito sem limites, absoluto. Em um Estado de Direito, a própria noção de direito pressupõe a noção de limite. Aquele velho dito de que “o direito de uma pessoa termina quando começa o direito de outra” traduz a mais pura verdade jurídica nesse modelo Estatal. Eu não posso ser livre para explorar, oprimir ou amesquinhar o outro. Eu não posso ser livre para produzir a desigualdade e a violência. Por isso, uma democracia, para mim, exige que a liberdade e a igualdade se integrem, na perspectiva de permitirem que amaioria imponha a sua vontade sem violentar o respeito às minorias. O “ser democrático” aponta, nessa medida, para a maior liberdade e igualdade possível institucionalmente asseguradas e garantidas a todos osmembros de uma sociedade, a partir das condições econômicas existentes em um dado momento da sua história. Revista da ESPM — E qual é (ou deveria ser) o papel dos advogados nesta sociedade democrática? Cardozo — Entendo que o “ser advogado” é, por definição, um “ser democrático”. Um advogado em regimes autoritários é apenas um patético componente de um espetáculo circense escrito previamente e que é jogado com cartas marcadas. Por essa razão, entendo que, ao se assumir a profissão de advogado, lutar pela democracia é uma decorrência impostergável e obrigatória. Acumpliciar-se, por ação ou omissão, a uma ditadura ou a um regime autoritário faz de um bacharel em Direito um “não advogado”, mesmo que tenha logrado êxito no exame da Ordem que o habilita para a profissão e pague pontualmente as suas taxas profissionais. Afinal, tinha total razão o grande Sobral Pinto ao afirmar que “a advocacia não é profissão de covardes”. Nem todos, lamentavelmente, se dão conta disso. Uma pena! Revista da ESPM — Quais as mudanças mais significativas registradas no campo do Direito que o senhor destacaria ao longo dos anos? Cardozo — São tantas que é difícil até enumerar. O processo da globalização determinou a formulação de relações jurídicas mundiais em uma dimensão totalizada e em uma dinamicidade até então inimaginável. Novos fenômenos que nasceram como frutos desse processo exigem novos equacionamentos e novas estruturações regulatórias e orgânicas que estão ainda em construção. Por outro lado, o desenvolvimento da ciência e das formas de comunicação intersubjetivas decorrentes da produção e da difusão social de novas tecnologias estão a exigir um “novo Direito” que pouco a pouco vai sendo construído. Vivemos ainda ummomento de transição em que as velhas estruturas jurídicas estão sendo substituídas ou derrubadas por novas realidades, Ao se assumir a profissão de advogado, lutar pela democracia é uma decorrência impostergável e obrigatória SHUTTERSTOCK.COM

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