EDIÇÃO 124 | 2022 | REVISTADAESPM 39 Cardozo — Eu diria que não apenas o advogado do futuro, mas também o do presente precisa entender de negócios e de tecnologia. O grande descompasso que hoje existe entre os nossos cursos de bacharelado e de pós-graduação com a nossa realidade atual faz comque não apenas os advogados, mas também os operadores do Direito em geral, estejam defasados em relação aos novos tempos em que vivemos. Os negócios de hoje são muito diferentes, em conteúdo e forma, dos que eram regidos pelo Código Napoleônico, no século XVIII, ou mesmo dos que motivaram as regras do nosso antigo Código Civil de 1916. De certa forma, pode-se dizer que o nosso próprio Código Civil de 2002 e a nossa legislação disciplinadora das relações negociais em geral têm dado mostras visíveis de já não estarem mais atendendo às novas realidades sociais. É inadmissível também que a estrutura da administração pública federal ainda tenha como uma das suas referências legislativas centrais um decreto-lei anterior à vigência da própria Constituição Federal de 1988 (Decreto-Lei nº 200/1967). Leis mais atuais, como, por exemplo, a do marco civil da internet, a da proteção de dados civis e a própria nova lei de licitações (Lei nº 14.133/2021), exigem compreensões teóricas e interpretativas mais atualizadas, estabelecidas a partir das novas realidades da vida econômica privada e Estatal que vivemos. O dogmatismo com que nos ensinamo Direito nas nossas faculdades, lamentavelmente, faz com que a maior parte dos operadores do Direito assuma posturas misoneístas e interpretações ultrapassadas diante dos velhos e dos novos textos legislativos que começama ser pouco a pouco editados. Os acalorados debates que hoje se apresentam nos tribunais relativos a novos modelos de negócios, como Uber, Airbnb, entre outros, bem nos demonstram isso. Revista da ESPM — Depois de toda essa obra como deputado, ministro de Estado da Justiça e advogado-geral da União, o que omotivou a aceitar o convite para se tornar professor da ESPM? Cardozo — Sinceramente, eu não imaginava, nessa etapa da minha vida, participar de um projeto tão empolgante e desafiador como este. Sempre fui umcrítico do ensino do Direito em nosso país, tanto no que diz respeito ao descompasso do seu conteúdo com a realidade, como tambémem relação à metodologia pedagógica utilizada. Frequentemente, profissionais do Direito não se tornam professores por vocação, mas por buscarem um status social do qual se servem, de ummodo ou de outro, nas suas respectivas áreas profissionais. Pensamnas suas carreiras antes de pensar nasmentes que precisam alimentar não comdogmas, mas com visões plurais que possibilitem o pensar do fenômeno jurídico de forma crítica. Pensam nos docentes como pessoas que apenas precisam obter um diploma ou uma habilitação profissional, mas não como profissionais que necessitamde uma formação que lhes permita obter um conhecimento jurídico, teórico e prático, de nível elevado, uma formação ética humanista e, ainda, uma compreensão domundo e domomento histórico Novos fenômenos que nasceramcomo frutos desse processo exigemnovos equacionamentos e novas estruturações regulatórias e orgânicas que estão ainda emconstrução SHUTTERSTOCK.COM
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