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 82 R E V I S T A D A E S P M – JANEIRO / FEVEREIRO DE 2008 Entrevista Eis o primeiro grande obstáculo: as pessoas não tiveram oportuni- dade de passar pela escola; não conseguem ingressar no mercado de trabalho porque não têm ensino médio, ensino fundamental. Se- gundo: a pessoa quando sofre um acidente, ou mesmo nasce com uma deficiência, acaba tendo di- reito de receber uma aposentado- ria por invalidez. Se ela conseguir um emprego, essa aposentadoria é suspensa na mesma hora e ela não consegue depois, caso perca o em- prego, reaver a aposentadoria... JR – Isso é um defeito da lei, pois a aposentadoria não pode ser ne- nhuma fortuna, não é? MARA – É um tipo de Bolsa Família, um incentivo à pessoa ficar ociosa. Há famílias que usam essa aposentadoria do deficiente para se manter. Claro que ele não vai sair de casa, fazer um rally de cadeira de rodas, penar para pegar um ônibus acessível para ir para o trabalho – e ganhar praticamente a mesma coisa. Ele prefere ficar em casa. Esse é um grande obstáculo para a inclusão no mercado de trabalho. Outro obstáculo é a própria dificuldade física que as pessoas têm para chegar ao local de trabalho, isso é um impeditivo muito grande. JR – Eu representei a ESPM num encontro, na Câmara Municipal, com você, e tratamos das formas como as instituições de ensino po- deriam oferecer mais e melhores oportunidades às pessoas com de- ficiência. Nas escolas particulares, sempre há a questão custo-benefí- cio. Por exemplo, uma escola que possibilite às pessoas portadoras de deficiência visual acompanhar o seu curso de Marketing não é um investimento muito grande, com pouco retorno? Quantos alunos cegos terá esse curso? MARA – Na cidade de São Paulo há 150 mil pessoas com deficiên- cia visual. Isso inclui cegueira e baixa visão. Para você ter um aluno cego em um curso de mar- keting, o investimento é mínimo. JR – Talvez eu esteja pensando de uma forma demasiadamente comercial... Mas por que um aluno cego, por que não dez – ou cem – alunos cegos? MARA – Mas é que sempre começa com um... Os investimentos não são tão grandes assim. Se você instalar um piso tátil, ele poderá andar sem ajuda. Vai precisar de uma impressora Braille, ou – se for no começo – há programas da pre- feitura para mandar imprimir o que quiser sem pagar nada. Tem insti- tutos que fazem isso. No caso de um vídeo que vá ser transmitido, existe uma coisa chamada “auto- descrição”, que faz uma descrição oral para que o cego possa en- tender o que está a acontecer ali. Se você quiser ter alunos surdos, você tem de ter intérpretes de Li- bras (Língua Brasileira de Sinais), que é uma pessoa que vai fazer a tradução para aquele aluno surdo, e acessibilidade para qualquer cadeirante, ou pessoa que tenha deficiência intelectual e tenha dificuldade de circular. JR – Você acha que, se uma ou várias faculdades criarem esse tipo de facilidades, haverá um número importante de candidatos? MARA – Acho que pode começar lentamente, irá aumentando, e tenho certeza de que vamos inter- ferir diretamente nos 80 mil – esse número vai subir, e muito! JR – E as escolas primárias e as es- colas de formação que são em sua maioria do Estado? MARA – Por isso que, antes de fazer o requerimento para todas as facul- dades de São Paulo, primeiro eu fiz para as escolas. Mas não estamos falando de absurdos, ou anomalias. Imagine uma escola que só aceita pessoas de um 1,70 m para cima, baixinhos não entram; quem tem cabelo encaracolado não pode freqüentar a faculdade, só quem tem cabelo liso. No fundo o que se combate é não dar a oportunidade para as pessoas freqüentarem o es- tabelecimento, ao determinar: “eu quero esse, mas não quero aquele”. Eu sempre gostei de estudar, de tra- balhar, aí acontece uma fatalidade e eu quebro o pescoço – poderia ser o braço, mas foi o pescoço – aí “APENAS 1% DAS MULHERES COM DEFICIÊNCIA TEVE OPORTUNIDADE DE PASSAR PELA ESCOLA.” Ð
        
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