Revista da ESPM Julho-Agosto_2010

julho / agosto de 2010 – R E V I S T A D A E S P M 33 C xiste uma longa tradição de es- tatismo na sociedade brasileira, associada à desconfiança emrelação ao capital privado e estrangeiro e à ideia de que o Estado tem condições de resolver boa parte das mazelas sociais do País. Nesse contexto, os governos vêm tentando implementar um “modelo” de crescimento dos gastos públicos correntes consagrado no texto constitucional de 1988, com vistas ao “resgate da dívida so- cial”, dívida essa supostamente herdada da fase política anterior a 1985, ao tempo em que se incorporam ao “modelo” pressões sobre gastos que são puramente corporativistas. Mais recentemente, esse perfil foi fortalecido por vários fatores, entre eles a ascensão de governos com viés estatista ainda mais forte no Brasil e em outros países da América Latina, além da asso- ciação entre a crise econômica do final de 2008 e a necessidade de maior intervenção do Estado na economia. Nesse contexto: (1) tem havido claro recuo das políticas liberalizantes implementadas junto ao lançamento do plano de combate à infla- çãomais bem-sucedido de nossa história recente, o Plano Real; (2) reforça-se o papel do Estado na expansãodesetoresbásicos, comoenergiaelétrica, petróleo, e o próprio segmento de telecomunica- ções (cuja privatização foi reconhecidamente um caso de sucesso), mesmo diante da enorme escas- sezde recursospúblicosquevigorahámuitosanos no País; e (3) recoloca-se em prática, com muito maiorforça,aideiadequeoEstadodeveserogran- de operador no financiamento das atividades de investimentonoPaís, captando recursos nosmer- cados internos a curto prazo e financiando esses investimentosnotadamenteviaempresas estatais, com prazos bemmais longos e juros subsidiados, encurralando, assim, os financiadores privados. Sóque, emquepesemconquistas recentes (comoo fimdahiperinflação,aflexibilizaçãobem-sucedida E Um dos fatores foi a as- censãodegovernoscom viés estatista ainda mais forte no Brasil e em ou- tros países da América Latina, além da associa- ção entre a crise econô- mica do final de 2008 e a necessidade de maior intervençãodoEstadona economia.Nessecontex- to temhavido claro recuo das políticas liberalizan- tes implementadas junto ao lançamento do plano de combate à inflação mais bem-sucedido de nossa história recente, o Plano Real. do regime cambial eageraçãode sal- dos fiscais relativamente elevados), o “x”da questão no diagnóstico do drama macroeconômico brasileiro (ou seja, das baixas taxas de cresci- mento da economia), continua a ser exatamente: (1) o forte crescimento e a alta rigidez dos gastos públicos correntes, decorrentes da implemen- tação domodelo de crescimento dos gastos acima referido, e (2) a carga tributária recorde que ele requer. Na raiz do processo, está o cres- cimento dos gastos correntes não financeiros (pessoal, outros custeios e programas de duração continuada, como nas áreas de previdência e as- sistência social, alémdos tradicionais segmentos de educação e saúde). Diante da queda da disponibilidade derecursosparainvestir,emquepesemoaumento da carga tributária e a própria reprogramação dos investimentos, seguiu-se o aumento do déficit e do endividamentopúblicos, para complementar o financiamento do investimento. Na fase seguinte, subiram as despesas de juros e a própria taxa de juros de mercado, em face do seguido aumento do endividamento público. O aumento da carga tributária reduz a renda disponível do setor pri- vado, atingindo de frente a poupança privada. No final, constatou-se queda ainda maior da pou- pança pública, sob o efeito tanto do crescimento dos gastos correntes não financeiros, quanto do relativo à despesa de juros, levando à derrocada dos investimentos públicos. Nesse processo, o excesso dos investimentos públicos sobre a poupança pública é financiado implicitamenteeempartepelapoupançaexterna, quando esta ingressa, e, ao final, pelo excesso de poupança privada sobre o investimento privado, conforme se deduz da restrição macroeconômica fundamental. Ou seja, dada a poupança externa, quanto maiores o primeiro excesso (no setor pú-

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