Revista da ESPM Julho-Agosto_2010

R E V I S T A D A E S P M – julho / agosto de 2010 36 Assim, querendo talvez firmar uma postura pró- mercadosobóbviainspiraçãodoMinistroAntônio Palocci, da Fazenda, o governo, mesmo tomando conhecimento pouco a pouco da situação econô- mica cada vezmais favorável que se descortinava, manteve a disposição de gerar superávits fiscais primários bemmais elevados do que seria neces- sário para estabilizar a razão dívida pública-PIB ao longo do tempo, o que equivale a acumular uma espécie de “bônus fiscal”, adquiridomais por fatores exógenos do que por esforços de ajuste, o que prevaleceu até bem pouco tempo. Em outubro de 2008, o superávit primário para os últimos doze meses atingia o valor máximo da série respectiva, de4,2%doPIB, anteumsuperávit deequilíbrio (ou requeridoparaestabilizar a razão dívida-PIBsobcertas condições), deapenas 2%do PIB 1 . Naquela altura, então, o superávit poderia ser cerca de 2,2% do PIB menor (o que equivale a R$ 70 bilhões, combase no PIB de 2009). Ou seja, o governo poderia correr o risco de destinar essa quantia a despesas não financeiras adicionais ou abrir mão de receitas nessa mesma magnitude, maspreferiuutilizá-la (talvezatépor acharquenão tinha escolha), como parte dos determinantes da redução da razão dívida líquida-PIB de 45,1 para 39,0% do PIB, entre outubro de 2007 e 2008 (veja gráfico 3). Apesar de ser difícil de calcular, defino essadiferençacomo“bônusfiscal”.Dadaa trajetó- riadesuperávitsobservados,quantomenorarazão dívida-PIB, maior o bônus. No gráfico 1, o bônus é dado pela área entre as duas curvas. Ao induzir à queda dos superávits fiscais primá- rios, a crise do final de 2008 empurrou o governo na direção de rapidamente esgotar esse bônus, e logo em seguida a lançar mão da parcela acumu- ladanopassado, aumentando a razãodívida-PIB. Diante da forte e rápida queda das vendas exter- nas, aatividadeeconômica internadesaboue com ela a arrecadaçãode tributos.Os superávits fiscais caíramrapidamente, porque, naUnião, ogoverno aprovou isenções tributárias temporárias para sustentar o nível de atividade de determinados setores e aumentou o ritmo do crescimento dos gastos correntes não financeiros. Como se vê no gráfico 2, a receita líquida da União caiu 1 ponto de % do PIB entre outubro de 2008 e setembro de 2009, mas depois se recuperou, voltando, em maio último, ao mesmo nível, em relação ao PIB, de antes da crise. Já a despesa não financeira aumentou nada menos que 1,8 ponto de % do PIB entre outubro de 2008 e maio último. Nesse interregno, pelos números por trás do gráfico, o superávit primário da União caiu 1,8 ponto de % do PIB, “consumindo” o bônus fiscal. 2000.12 2001.05 2001.10 2002.03 2002.08 2003.01 2003.06 2003.11 2004.04 2004.09 2005.02 2005.07 2005.12 2006.05 2006.10 2007.03 2007.08 2008.01 2008.06 2008.11 2009.04 2009.09 2010.02 4,4 3,9 3,4 2,9 2,4 1,9 1,4 0,9 Super. Prim. nos últ. 12 meses SP Requerido GRÁFICO 1. SUPERÁVIT PRIMÁRIO DO SETOR PÚBLICO CONSOLIDADO, DADOS OBSERVADOS E REQUERIDOS PARA ESTABILIZAR A RAZÃO DÍVIDA LÍQUIDA-PIB 20,0 19,5 19,0 18,5 18,0 17,5 17,0 16,5 DNF Total Ult. 12 meses em%do PIB RL Total Ult. 12 meses em%do PIB GRÁFICO 2. RECEITA LÍQUIDA E DESPESA NÃO FINANCEIRA DA UNIÃO SOBRE O PIB, PÓS-CRISE out/08 dez/08 fev/09 abr/09 jun/09 ago/09 out/09 dez/09 fev/10 abr/10 19,8 16,7 18,8 19,8 18,5

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