Revista da ESPM Julho-Agosto_2010
R E V I S T A D A E S P M – julho / agosto de 2010 50 ENTREVISTA GRACIOSO – Paulo, a nossa entrevista tem por objetivo dar a você a oportunidade de falar do ensino brasileiro de modo geral – e ninguémmelhordoquevocêpara isso–e fa- zer uma comparação entre o ensino público eoprivado.Que fatores influemna situação atual do ensino público? Está na ordem do dia os resultados do Enem, por exemplo. E os jornais, justaou injustamente, enfatizam muitoasdiferençasentreopúblicoeopriva- do no Enem. Quais as perspectivas emrela- ção à situação de São Paulo, em particular? PAULO RENATO – Temos de entender a situação educacional do País numa perspectiva histórica. Não dá para simplesmente comparar situações de escolas, sistemas de ensino particular ou público, nummomentodotempo.Issoéumprodutodeuma trajetória, de uma história. Até o início do governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, não tínhamos sequer universalizado o acesso à edu- cação primária. Tínhamos, ainda, 13%de crianças entre 7 e 14 anos fora da escola. No Nordeste, essa média era de 25%, ou seja, uma entre cada quatro criançasestava foradaescola.De fato, oBrasil –que seorgulhade ter tidoumaescolapúblicamuitoboa nos anos 50 e 60 – nunca tinha oferecido educação para todos. Em 1960 havia 40% de analfabetos na população brasileira e 40% de crianças fora da escola. Isso significa que era umsistema bompara poucos-para a elite. Fomosmelhorando ao longo do temponaquestãoda cobertura,mas ainda che- gamosem1995comumaproporçãosignificativade crianças fora da escola. O que conseguimos fazer no governo do Presidente Fernando Henrique foi trazer toda criança para a escola em todo o Brasil. Isso graças a uma reforma fiscal que fizemos com acriaçãodoFUNDEF(FundodeDesenvolvimento do Ensino Fundamental), que nos permitiu chegar a 97% de crianças na escola e melhorar também o ensino médio. Ao mesmo tempo, criamos um sistema de avaliação do ensino fundamental e su- perior. Inicialmente, nos concentramos na questão do ensino básico, com um sistema de avaliação que revelou aquilo que todos sabiam: a qualidade era muito ruim. E não é que a qualidade caiu, ela semprefoiruim.Quandovocêtrazmaisgentepara dentrodaescoladeoutrossegmentosdapopulação, a tendência das médias de aproveitamento dos alunos é cair. Isso se dá porque o desempenho dos alunos está relacionado com a condição socioeco- nômica da família. A correlação se faz mais clara entre a escolaridade da mãe e o desempenho do aluno. Essa escolaridade também está relacionada afatoressocioeconômicos.Então,secriaumcírculo de repetição virtuoso ou vicioso, dependendo do segmento da população. Trouxemos para a escola o segmento da população menos escolarizado, os filhos de pais analfabetos... LUIZSALES – Issodeveserbemmarcadonas regiões do Nordeste. PAULO RENATO – Quem não estava na escola, agora está melhor, sabe mais. A escola pode ter melhorado, mas quando se junta tudo e faz uma média, ela cai, porque há um contingente mais heterogêneo do ponto de vista social. Por um lado, constamos essa deficiência de qualidade. Por outro lado, medimos a qualidade ao longo do tempo e verificamos que ela não melhorou, mas parou de cair, apesar da grande incorporação. Eu diria que foi uma situação relativamente favorável. Agora começamos a melhorar. Já temos notícias de que as avaliações internacionais do PISA – Programa InternacionaldeAvaliaçãodeAlunos,desteano,vão mostrar uma melhora importante, especialmente em São Paulo. O grande desafio que temos hoje é melhorar a qualidade da educação medida pelo desempenho dos alunos. LUIZ SALES – Em todos os níveis ou só no fundamental? PAULO RENATO – Em todos os níveis. Essa é a diferença entre ensino público e privado, que faz umapré-seleçãosocioeconômicadosalunos.Então, a escola privada pode ser amesma, o desempenho vai ser melhor porque o background cultural dos alunos melhora, da mesma forma que o ingresso de outros segmentos da população no ensino faz a média diminuir. Independentemente de professor, qualidade da escola, disciplina, métodos de ensino ou qualquer outra coisa, o nível da escola privada, necessariamente, serámelhor, porque o aluno vem
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