Revista da ESPM MAI-JUN_2008
16 R E V I S T A D A E S P M – MAIO / JUNHO DE 2008 Entrevista melhores do que as pessoas a quem pagamos trinta mil dólares para falar aos empresários de São Paulo... GRACIOSO – Recentemente, li no jornal que um grupo de agricultores alemães fizeram uma visita ao Brasil para conhecer nosso agronegócio. Foram parar em uma fazenda no Mato Grosso, e o porta-voz do grupo disse que aquela fazenda, com 36 mil hectares, era maior do que as terras de todos aqueles fazendeiros alemães, e que a produtividade média da soja, do milho, do algodão daquela fa- zenda era maior do que a deles, em termos relativos. DAMATTA – Escrevi um livrinho chamado Conta de mentiroso – são 7 ensaios de antropologia brasileira – e um é sobre a inflação, onde tento discernir o porque da nossa tolerância coma inflação, durante todooperíodo republicano e até no período imperial. A resposta, para mim, era óbvia: era uma sociedade indexada, hierárquica, que tem várias moedas. Se você era escravo, não podia usar dinheiro; se você era umcomerciante, então lidava com o dinheiro; se você era nobre, era o seu secretário que lidava com o dinheiro; você lidava com outro tipo de dinheiro, que eram títulos, nomeações; e se você se transformava num agente do estado, tinha uma caneta que assinava nomeações. A obra doMachado deAssis – que tenho relidodemaneira sistemática – émuito interessante porque todos os persona- gens ganham nomeações ou querem nomeações do Estado. Não é à toa que, em nossos cerimoniais, até hoje – num Governo Petista supostamente igualitário, revolucionário – tudo é o Presidente Lula que assina, e isso vem de onde?Você já viu o Bush assinando alguma coisa?Aparece a presidenta da Alemanha assinando alguma coisa?O Roosevelt declarou guerra contra os japoneses aomicrofone no Congresso Nacional e o Churchill amesma coisa – depois vai ao gabinete assinar o de- creto.Aqui temque ter assinatura, com firma reconhecida; se não, não vale. GRACIOSO – Não somos só nós. Na Itália existe a “carta bolata”, umpapel com um selo, exatamente igual. DAMATTA – Em Lisboa, vi uma fila com, aproximadamente, 100 pessoas; perguntei se era um show e me dis- seram “é um cartório”. É igual. Mas, na Europa, foi possível conciliar essa “NO NOSSO RACISMO, O MESTIÇO ERA POSITIVO, PORQUE BRANQUEAVA O BRASIL.” Gravura:Tiago Gualberto
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