Revista da ESPM MAI-JUN_2008

98 R E V I S T A D A E S P M – MAIO / JUNHO DE 2008 Pluralidade histórica do Ser não somente de mentalidade, mas também de situação objetiva. Taistransformaçõesnãoocorremapenas na mente, mas no conjunto do pensa- mentohumanoedomundoaoqual ele responde.Atécnica, por exemplo, tema função de aperfeiçoar a relação entre o homemeanatureza: peloelevador, nós nos elevamos sem dificuldade ao topo dos arranha-céus, que nós construímos graças à invenção do cimento armado. Trata-se de uma transformação das condições de fato da nossa existência, que pode ser descrita pela categoria do enfraquecimento das relações de força, das relaçõesviolentas . Istosedá também na sociedade: Norbert Elias, teórico da sociedade da corte e da modernidade, comosociedademais formal, aproxima anossa sociedadedacorte feudal, onde os conflitos sociais se resolviam de maneira formal, como, por exemplo, por meio da mediação do soberano, diferentementedoperíodomedieval em queos conflitos eramresolvidospelaes- pada: comacorteé reduzidaaviolência das relações humanas. No feudalismo, os conflitos deixam de ser resolvidos por meio da violência, passando a ser resolvidos de forma mais pacífica. Isto seconfiguracomoumenfraquecimento do período anterior, a emancipação em relação ao período medieval dando-se por intermédio de um processo de en- fraquecimento. Já na modernidade, os enfraqueci- mentos são bastante diferentes: por exemplo, o modo como Max Weber enxergaodesenvolvimentodocapitalis- mo moderno partindo da Bíblia e da éticacalvinista; istoenfraqueceas fontes sagradasdanossaética, tornando-seum fato histórico.Antes, o lucro pertencia a Deus enãodeveria ser consumido, hoje ocapitalistanãoconsomeoganho,mas guarda-o para, em seguida, abrir uma nova empresa. Pode-se citar também a psicanálisedeFreud, queeleprópriovia como uma espécie de ferida no proces- so narcisístico do eu. Estes aspectos são exemplos do desenvolvimento da civilização pela redução da violência imediata ou da certeza absoluta. Na pós-modernidade em que vivemos, não se pode mais dizer que existe uma única história, uma única verdade, um único tipo de sociedade. Devemos reco- nhecerque,seasculturas,conformedizia Lévi-Strauss,sobreviveramtantosmilênios, é porque possuíam uma racionalidade própriae,portanto,muitosdospovosditos primitivosnãopodemmaisserassimcha- mados. Os próprios povos daAmazônia, por exemplo, que não tinham médicos, empregavam medicamentos alternativos quehojeemdiamuitasempresasquerem tomar e comercializar. O enfraquecimento torna-se, então, pensamento dos fracos e dos pobres, pois todos os grandes detentores de poder de outrora – as autoridades em geral: o Papa, os chefes de governo, os sindicalistas – têm sua força reduzida no processo. Todos esses atores sociais teriam motivos para lamentar a perda do senso forte de verdade, que cada vezmais se enfraquece. Opensamento absoluto é sempre o pensamento da autoridade. Platão, por exemplo, além de grande pensador, era um grande reacionário na política. Numa conferência na década de 60, ele advertiu que escu- tar o silêncio não significa fazer mística. Eu tendo a associar esta idéia à dissertação de Benjamin acerca das teses sobre a filosofia da história, na qual Benjamin diz que a revolução, mais do que se inspirar em um pensamento a ser realizado, numa ideologia forte, se inspira no silêncio dos fracos que foram silenciados. O importante é que ocorre, hoje em dia, um conflito essencial entre aqueles que são portadores de verdades alternativas e os defensores da verdade única e abso- luta, conflito este que ilumina a diferença entre o pensamento fraco dos fracos e o pensamento fraco da tranquilização. Google Images

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