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Moda e estilo de vida 119 SETEMBRO / OUTUBRO DE 2008 – R E V I S T A D A E S P M àquele grupo, você está fugindo de alguma coisa? Não costumamos dizer que a felicidade é composta pelos momentos que vivemos? Faz pouco tempo, numa situação muito específica, assisti a um show de uma dupla caipira – que de caipira não tinha nada – e eu era um peixe fora d´água. As pessoas gritavam, batiam os pés, estavam extremamente felizes, em estado de êxtase. Na semana passada, fui assistir a um grupo espanhol que pesquisa, recupera e interpreta música medieval – Hesperion, do Jordi Savall – e havia um grupo de velhinhos, muito interessante, ex- tremamente homogêneo e aquelas pessoas estavam absolutamente em êxtase. São momentos de felicidade extrema para grupos diferentes. Se você entrar na internet, ela é absolutamente diversificada e fragmentada, e encontramos comunidades que têm profunda identidade com temas extremamente específicos e ali ele encontra os seus. Numa sociedade nervosa, agitada, em transformação constante, ali ele encontra os seus onde consegue fincar alicerces que dão um míni- mo de estabilidade e permite que ele seja feliz partilhando idéias e opiniões parecidas. PAULO – De vez em quando a gente se confunde, porque – como somos membros daquele grupo – achamos que o comportamento do nosso grupo deve ser o compor- tamento da humanidade. NIZIA – Concordo. CLÁUDIA – Pois eu não acho. Eu poderia falar do esmalte: na classe C, o primeiro item de consumo das mulheres era o esmalte, segundo batom e terceiro o xampu. A cada três meses, lança-se uma nova linha de xampu. Não dá tempo de acabar o frasco – eu lavo o cabelo todo dia – e já veio outro; estou fa- lando do conhecimento que tenho dessas pessoas porque trabalhei com leitoras de classe C durante muito tempo. A questão da moda e da beleza, para as mulheres, tem um fator de auto-indulgência muito grande. É comum você ouvir em mesa, em pesquisas: “Estava muito infeliz e tinha dois cami- nhos: ou comprava um batom ou comia um chocolate”. JRWP – Ou arranja um namorado... CLÁUDIA – Não, o namorado é mais difícil. AMÁLIA – A marca, hoje, tem um significado muito importante – como foi aqui exposto o caso da Harley-Davidson – porque ela penetra na mente e no coração da pessoa. Ela entra e é capaz de dizer se você tem valor ou não, de acordo com o que você usa. Uma pessoa é capaz de se sentir mais feliz quando compra coisas – já foi provado cientificamente que isso acontece. Sob esse ponto de vista eu acredito que as grandes grifes estudam muito o comportamento humano para que consigam en- tender o que está faltando nesse ser humano, pois estará faltando alguma coisa. MÁRIO – Paulo, vou discordar de você, o que é um atrevimento. Naquele show, quando aquelas pessoas estão urrando, elas não estão felizes; elas estão alegres. Há três níveis de satisfação humana, de gratificação: prazer, alegria e felicidade. Prazer é tudo ligado aos sentidos, é o que a sociedade de consumo consegue fazer maravi- lhosamente, principalmente em alimentos, cosméticos, perfumes – prazer imenso – e prazer é mais forte do que a alegria, por isso as pessoas são motivadas por prazer. Só que o prazer traz um problema: tem de ser constantemente reno- vado, porque só dura enquanto os sentidos estiverem funcionando: “Eu acabei de comer, não tive mais prazer e daqui a 24 horas vou comer de novo alguma coisa boa”. Felicidade é algo que, ulti- mamente, os estudiosos chamam de “bem-estar subjetivo”. Nor- malmente, pergunta-se “você tem sido feliz na sua vida”, e aí você pega um apanhado de coisas. Aí é que vem o grande buraco: a felicidade e a alegria não são absolutas, mas relativas. Eu sinto um bom perfume, posso até com- parar com perfumes passados, é evidente, ou uma boa comida, mas felicidade é um estado que eu vou me comparar com outras pessoas que estão viajando, que são mais bonitas, que são mais ricas, menos ricas. A pessoa vai dizer “nesse momento estou sendo muito fe- liz”, mas está usando uma palavra errada: “Estou muito alegre, estou tendo prazer”. E a vida dela pode ser um inferno. Acho que para es- sas marcas, a bolsa Louis Vuitton e outras, dentro da sociedade, temos de resgatar uma palavra antiga, mas que se aplica: Fetiche – a marca acabou virando um fetiche. Vamos ver que a nossa civilização, nesse sentido, não é muito dife-
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