Revista da ESPM - SETEMBRO_OUTUBRO-2010

R E V I S T A D A E S P M – setembro / outubro de 2010 28 Antesdetudo,oquechamaaatençãonas duaspalavras escolhidasparanomear as duas metades de uma casa editorial é a metáfora que elas suscitam. É como se a antiga Time Inc. fosse um híbrido de céue inferno: deumlado, frades entoan­ do cânticos sob tetos góticos; do outro, políticos de cara feia urdindo negociatas inconfessáveis. Claro que não é nem era nada disso. Mesmo assim, a metáfora deixoumarcasmoralistas no imaginário de gerações e gerações de editores. Ainda voltaremos a essas marcas. Antes de esmiuçá-las, contudo, convém come- çar pelo começo. PARTE I O primeiro jeito de contar a história O começo é entender como é que surgiu a sepa- ração entre “Igreja” e “Estado” no ambiente da imprensa. Ummodo simples de entender é tentar fazer comque a nossa imaginação volte no tempo e tente visualizar a vida como ela era no passado. Pensemos numa empresa jornalística de perfil clássico,numaeraremota.Pensemosnumagrande revista, ou numgrande jornal àmoda antiga. São feitos em papel, letra preta sobre fundo branco. Entre o fim do século XIX e meados do século XX, irão prosperar e atingir o apogeu. Na reda- ção, máquinas de escrever barulhentas e homens fumando comumamão e amarrotando as laudas coma outra. Alguns passeiamcomviseiras. Esta- mos num filme em preto e branco. Naquela época, os melhores profissionais não se deixavam capturar por aqueles que, insidiosos ou melífluos, procuravam influenciar a livre forma- ção da vontade do leitor. Jornalista que tinha a consciência heroica ou romântica de sua missão sabia muito bem: o leitor era seu patrão, ponto final. Ele era a “Igreja”, pois se encarregava dos assuntos da “alma”: a “alma” do negócio, ou seja, a credibilidade do jornal. Os patrõesmais talentosos tambémsabiam. Seus clientes eram os leitores; os anunciantes apenas pegavam carona nessa relação de confiança. A sustentação essencial vinha do leitor, que só pagava pelos jornais porque acreditava que eles tinhamumcompromissodelheentregarumrelato honesto sobre os fatos de seu interesse. O leitor sabia que os jornais podiam errar, mas confiava no propósito que eles tinhamde procurar acertar. Por isso, pagava. Por isso, os negócios cresciam. Naadministraçãodessesjornais,osassuntosmun- danos, aqueles que não diziamrespeito à “Igreja”, recaíam no outro departamento, o “Estado”. Era aí que os funcionários se descabelavam para ver como fechar a folha de pagamentos no final do mês, ou para fazer sair aquele financiamento decisivo, ou para vender anúncios. Eram eles que tinham de administrar a conversa dos represen- tantes dos anunciantes, que tinham o péssimo hábito de perguntar se não havia um jeitinho de pautar uma matéria favorável ao seu produto. O pessoal do “Estado” – isso naqueles tempos, estamos aqui imaginandocomo tempos gloriosos – dizia que não, que não tinha jeitinho nenhum. Interesses comerciais não poderiam aterrissar na mesa dos editores, reservadas inteiramente às questões da “alma”. Com essa mística, a velha analogia prosperou. Com o tempo, alguns se radicalizaram. Come- çaram a proclamar que era preciso erguer uma muralha da China entre a “Igreja” e o “Estado”. Outrosqueriamelevadores separados: umparaos contatospublicitários, outroparaos repórteres.No nosso velhomundo ideal, a turma da “Igreja”mal se encontrava com os funcionários do “Estado”, unsnãodavambomdiaaosoutros.Namorar, nem Foi depoisdeHenryLuce e sua determinação em explicitar que suas pu- blicações existiam para servir ao interesse públi- co,queométodo“Igrejae Estado” virou um padrão organizacional para gerir os negócios e preservar a integridade jornalística. © TIME Magazine

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