Revista da ESPM - SETEMBRO_OUTUBRO-2010

R E V I S T A D A E S P M – setembro / outubro de 2010 34 Ela ensina que a atividade jornalística não alcança a excelência se não deixar claro, bem no alto da escala de valores, a quem é que aquela empresa presta serviços. Aí é que está: ou ela bem trabalha parao leitor (internauta, telepectador, ouvinteetc.), outrabalhaparaoanunciante, ou, ainda, paraseus donos ou financiadores (um banco que não quer aparecer, um agente do governo ou até mesmo uma igreja, aí em sentido literal). Se trabalha para o leitor, e sabe disso, a empresa deixa bem claros e públicos os parâmetros que ela segue. Nesse caso, está jogando limpo. Se, deoutro lado, admite colaborar com os interesses do anunciante – sem deixar claros esses procedimentos para o público –, está tapeando seu cliente principal. Por isso, nosdiasquecorrem, dizer queos critérios do negócio, numa empresa jornalística, devem se subordinar aos critérios editoriais não é apenas uma tautologia. A saúde de todo veículo dedicado a informar o público dependerá desse jogo limpo: o cliente (oquepagapela informação) precisa ter a segurança de que os conteúdos forampreparados segundoosseusinteresses,nãosegundoambições estranhas quenão sedeixamver claramente. Sem isso, o vínculo de confiança tende a se deteriorar. Enfim, os formatos e os protocolos das relações entre “Igreja” e “Estado” podem variar bastante, podem ser mais distantes em níveis hierárquicos mais baixos, podemser mais próximas emoutros níveis, mas, de algum modo, haverá sempre al- guma separação entre as duas áreas. Se não, das duas, uma: ou o sucesso virá em doses tímidas, e por pouco tempo, ou o negócio de que estamos falando não é exatamente jornalismo. No final do século passado, o diário Los Angeles Times anunciou que derrubaria o muro que se- parava a “Igreja” do “Estado”, o que suscitou um bom debate. A partir daí, profissionais da área de marketing ganharam ingresso nas editorias para sugerirassuntosdepauta, numadrásticamudança de cultura. Depois disso, muitos solavancos se seguiram, entre eles os solavancos econômicos quealcançaramquase todosos jornaisnosEstados Unidos. O ponto aqui não é fazer a análise das crises sucessivas que vieram. Só o que interessa é registrar que, lá pelas tantas, um grande jornal americano julgouque tinhadepôr omuro abaixo. E pôs. Por um tempo, mas pôs. Depois viriam trocas de direção no jornal e essas relações se “normalizariam” outra vez, mas emoutras bases, numasequênciade reformasquenãovêmaocaso. A atitude heterodoxa do diário californiano indicava uma crise no modelo. Uma crise real. A necessidade de revê-lo, de reestudá-lo, de entender de que modo ele (ainda) dá certo, e em que condições, estava escancaradamente posta. E continuou em pauta. Hoje, nos Estados Unidos, o debate a respeito é no mínimo acalorado. Ou mesmo ensandecido. Para certos observadores, o quadro é tão desalentador que poderia matar de desgosto. “ Se Herny Luce estivesse vivo até hoje, ele morreria ”, escreveu JohnBrady, professorde jorna- lismodaUniversidadedeOhio. “ Nos ‘UnitedStates of Amarketing’, as revistas deixamas redações abertas para a propaganda sem a menor cerimônia ” ( Church and State , em http://www.foliomag.com/2008/ church-and-state).

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