Revista da ESPM - SETEMBRO_OUTUBRO-2010

R E V I S T A D A E S P M – setembro / outubro de 2010 48 relativa à garantia da liberdade de expressão e de manifestaçãodopensamento(art.5 o ,IX), (b) aque se refere ao seu exercício, independentemente de qualquer restrição (art. 220), e (c) a que estabelece a liberdadedoexercíciodequalquer trabalho, ofício ouprofissão(art.5 o ,XIII).Aesserespeito,oMinistro GilmarMendes, do STF, assimsemanifestou: “No campo da profissão de jornalista, não há espaço para a regulação estatal quanto às qualificações profissionais. O art. 5 o , incisos IV, IX, XIV, e o art. 220 não autori- zam o controle, por parte do Estado, quanto ao acesso e exercício da profissão de jornalista. Qualquer tipo de controledessetipo,queinterfiranaliberdadeprofissional no momento do próprio acesso à atividade jornalística, configura, ao fim e ao cabo, controle prévio que, em verdade, caracteriza censura prévia das liberdades de expressão e de informação, expressamente vedada pelo art. 5 o , inciso IX, da Constituição”. A incompatibilidade da norma ainda era evidente se considerado o momento da história nacional em que nasceu o Decreto-Lei 972/69: editado pelos minis- tros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar, o referido de- creto foi, a bem da verdade, outorgado por uma Junta Militar que sequer tinha atribuição, mesmo à época, para legislar por decreto-lei. De acordo com a Consti- tuição de 1967/1969, apenas o Presidente da República estava autorizado a fazer uso do decreto-lei. Como salientou Saulo Ramos em artigo publicado na Folha de S.Paulo em1992, “do ponto de vista formal, a origem do regulamento dos jornalistas também é espúria” . Além disso, é óbvio que a norma em questão encontrava sua gênese no interesse do Governo Militar em restringir a liberdade de imprensa – exatamente como a Constituição Federal proíbe – sendo impossível, assim, ocorrer a recepção de uma norma pela outra. Embora a incompatibilidadedodispositi- vo com a Constituição Federal parecesse óbvia para alguns, havia uma dificuldade a trans- por: na parte final do dispositivo constitucional que estabelece a liberdade do exercíciode qualquer trabalho ou profissão, é feita uma ressalva que subordina tal liberdade ao atendimento das “qua- lificações profissionais que a lei estabelecer” . 3 Para os defensoresdaexigênciadodiplomaemcursosupe- riordejornalismoparaoexercíciodaprofissão,essa frase justificava o comando do Decreto-Lei. Para aqueles que defendiam tese contrária, tratava-se de saber se, na profissão de jornalista, tal exigência não contrariava a liberdade de imprensa. O Supremo Tribunal Federal já tinha se manifes- tado sobre assunto semelhante em 1971, quando foi discutida a regulamentação do exercício da profissão de corretor de imóveis. À época, asse- verando que tanto a Constituição Federal de 1946 quanto a de 1967 propugnavam pelo princípio da liberdade profissional, o Ministro relator do processo, Thompson Flores, consignou que “A liberdade do exercício profissional se condiciona às condições de capacidade que a lei estabelecer. Mas, para que a liberdade não seja ilusória, impõe-se que a limitação, as condições da capacidade, não seja de na- tureza a desnaturar ou suprimir a própria liberdade” . A conclusão era clara demais para que não fosse relembrada no julgamento do recurso que tratou do diploma de jornalismo. A subordinação da liberdade do exercício de qual- quertrabalhoàsqualificaçõesprofissionaisquealei estabelecernaturalmentedizrespeito,unicamente, às profissões cujo exercício exige conhecimento técnico específico, tendo em vista a proteção da coletividade. Isto decorre de intuitivas razões de segurança social e de interesse público, que não se aplicam,evidentemente,aumaatividadeintelectual desprovida de especificidade técnica e baseada no exercício intelectual, como o jornalismo. Nessa perspectiva, a profissão de jornalista não necessita de qualificação técnica ou profissional específica com vistas à proteção da coletividade. Diferentementedas profissões de engenheiro,mé- O dispositivo do Decre- to-Lei apresentava uma clara incompatibilidade com a Constituição Fe- deral, que consagrou normas declaratórias de diversas liberdades públicas, entre as quais a relativa à garantia de liberdade de expressão e de manifestação do pensamento.

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