Revista da ESPM_JAN-FEV-2012
s e t e m b r o / o u t u b r o d e 2 0 1 1 – R e v i s t a d a E S P M 43 } O pentecostalismo é uma nova adaptação do sistema. Nessa relação capitalista, pagar pelo milagre é algo absolutamente normal. ~ obra de Allan Kardec. Perceba que, no pas- sado, a religião era competitiva, ou seja, sou padre jesuíta e vim ao Brasil para converter as pessoas e salvar a alma delas. A única maneira de isso acontecer é batizá-las na minha igreja. Isso tinha um correspondente político: quando o jesuíta batizava o índio, automaticamente ele passava a ser súdito do rei de Portugal. Então, o jesuíta não era só um emissário de Deus, mas um emissário do Estado absoluto português. GRACIOSO – Tanto que emcada caravela por- tuguesa tinha um padre, um missionário. HERÓDOTO – Sem dúvida. E na medida em que o cristianismo português expandia-se, o império crescia, porque a base de sustentação do Estado era a religião. Quando Henrique VIII, no século XVI, mudou de religião, todos na Inglaterra foram obrigados a mudar tam- bém. Caso contrário, seria perseguido ou teria que ir embora para as colônias do outro lado do Atlântico. A religião do rei é a mesma do povo, porque nesse momento há uma fusão do Estado absolutista. A partir do desenvolvi- mento da democracia, com o liberalismo, isso se perdeu. Hoje, o Estado é laico e a compe- tição que existia no passado, esse confronto do padre contra o rabino ou contra o pastor, perdeu o sentido. As pessoas têmmais espírito crítico, mais acesso, mais comunicação e mais liberdade para escolher sua religião. Na igreja católica ninguém mais fala mal dos pentecos- tais, que também não falam mal nem mais do candomblé, da umbanda ou da quimbanda. A forma de convencimento mudou. Uma curio- sidade é que algumas religiões mais tradicio- nais − como o catolicismo, os pentecostais e o Islã − arrebanham adeptos, diferentemente do budista. Não há “evangelização” no budismo, ninguém é convencido a virar budista. De to- das as tradições conhecidas, a única que não tem catequização é o budismo. MÁRIO – Mas o judaísmo resiste muito em granjear adeptos, ele rejeita também. HERÓDOTO – Sim. E aí temos um outro fenô- meno sociológico. O judaísmo não é para todo mundo. É para o povo judeu. MÁRIO – É, porque o judaísmo tem de pensar em quatro pontos: cultural, reli- gioso, genético e o Estado. Tive uma na- morada que durante muito tempo tentou se converter ao judaísmo e foi rejeitada. Agora foi aceita, mas é dificílimo. HERÓDOTO –Hoje, há setores bastante liberais em que, se a pessoa quiser, consegue se converter. MÁRIO – A que você atribui o fato de o es- piritismo ter mais adeptos no Brasil do que em qualquer outro lugar do mundo? HERÓDOTO – É um fenômeno que se deve a um homem chamado Bezerra de Menezes. Ele e mais alguns intelectuais do começo do século XX trouxeram o espiritismo para o Brasil. Humberto de Campos, além de ser um grande escritor, era também espírita e ajudou a divulgar a religião. Ele tem alguma semelhança com o espiritismo africano, tan- to que, quando se diz que a pessoa é espírita, ela fala: “Sou espírita, mas de mesa branca, não de terreiro”. MÁRIO – E tem o kardecista. HERÓDOTO – Sou kardecista. A expressão “mesa branca” dizia “não sou do terreiro”. Essa tradição africana impulsionou e abra- Heródoto Barbeiro
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