Revista da ESPM_JAN-FEV-2012
s e t e m b r o / o u t u b r o d e 2 0 1 1 – R e v i s t a d a E S P M 47 S o f i a E s t e v e s ES PM ta, fui jogado nessa situação e me disseram: “é intuitivo”. O budismo não é uma religião revelada por Deus porque Buda não é um Deus. É apenas um exemplo a ser seguido. Essa é a confusão. Buda não faz milagres, não intercede pelas pessoas. Ninguém faz oração ao Buda para mudar a realidade porque ele não muda. Ele diz: “Você está sozinho”. Essa é a dificuldade dessa religião. GRACIOSO – Há 3,5 mil anos, os filósofos gre- gos diziam exatamente a mesma coisa. HERÓDOTO – Sim. Tem coisas dos filósofos gregos que estão no budismo e tem mais: no último capítulo do meu livro você vai observar que alguns pontos do budismo foram parar dentro do cristianismo. O Buda foi chamado de São Josafá pelos peregrinos cristãos do Oriente, que achavam ser um santo da igreja. MÁRIO – Na ESPM temos um projeto cha- mado Prece (Projeto de Religiosidade e Espiritualidade no Consumo e nas Em- presas). Em 2007, tivemos uma edição da Revista da ESPM com o tema Espiri- tualidade nas Organizações. Como você encara o momento e a oportunidade de haver espiritualidade nas organizações? HERÓDOTO – Tem a boa-fé e o puro ma- rketing. A espiritualidade dentro de uma organização é um fenômeno individual, não é coletivo. A não ser que se faça como no supermercado japonês, com uma filial em Pinheiros, que pertencia a uma religião xintoísta. Lá, antes de começar o trabalho, todos rezavam. Ali seria um braço comercial da religião. Não estamos falando disso e sim de espiritualidade, um fenômeno pessoal que não deve ser confundido com ética e moral, ainda que esses valores existam nas religiões. A espiritualidade envolve algo que está além do material, que é abstrato e intan- gível. Por exemplo: suponhamos que Deus tenha uma forma. Como fazer com que todos aceitem? Não dá. Se você disser: “Nossa empresa é ética e está compromissada com a transparência e a sustentabilidade”. Sim, todos faremos isso. Mas não dá para fazer com que as pessoas identifiquem-se com a espiritualidade, porque ela é materializada com a religião A, B ou C. Qual delas vai se impor sobre as demais? Se eu aplicar um princípio religioso – como Maria, que deu à luz, Jesus, virgem – é um dogma da igreja, que todos terão de aceitar, sejam ou não cristãos. MÁRIO – Como definir espiritualidade? Tive essa dificuldade quando escrevi minha tese de doutorado em Teologia. Li umas 154 mil definições. Espiritualidade advém do latin spiritus , que significa so- pro vital, energia. É uma força primitiva original, que se revela pela tomada de consciência de uma dimensão transcen- dente. É acreditar no além. E se, numa organização, um grupo de pessoas diz que a coisa não se limita ao tumor na garganta do Lula, tem algo além que a fé nas igrejas pentecostais procura resol- ver no “aqui e agora” e na igreja católica no “lá e então”. Essa energia transcen- dente e essa tomada de consciência vai se revelar no “aqui e agora” por valores em relação a si mesmo, aos outros, à natureza e a tudo que se considere útil. Se esses valores são materialistas, você terá uma espiritualidade fetichizada. HERÓDOTO – Não entendo como uma corpo- ração pode ser fetichizada. MÁRIO – A corporação não, mas seus membros. GRACIOSO – Precisamos tomar cuidado com o sentido que se dá à espiritualidade. Na verdade, ela se traduz por integração à comunidade, respeito ao interlocutor e sustentabilidade. São coisas óbvias. HERÓDOTO –As empresas precisamentender que devem atuar no campo da ética, ainda que seja a ética concorrencial e do capitalismo. Heródoto Barbeiro
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