Revista da ESPM_JAN-FEV-2012

R e v i s t a d a E S P M – j a n e i r o / f e v e r e i r o d e 2 0 1 2 56 no Olimpo sobre a serventia dos Deuses frente à imortalidade dos homens. No Gênese, Jeová Deus plantou um jardim no Éden, no oriente, e ali colocou o homem que modelara. Jeová Deus fez crescer do solo toda espécie de árvores formosas de ver e boas de comer, a árvore da vida no meio do jardim, e a árvore do conhecimento do bem e do mal (ou “a árvore do conhecimento de todas as coi- sas”). Um rio saía de Éden para regar o jardim e de lá se dividia formando quatro braços. (...) Jeová Deus tomou o homem e o colocou no jardim do Éden para cultivar e o guardar. E Jeová Deus deu ao homem este mandamento: “Podes comer de todas as árvores do jardim. Mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás, porque no dia em que dela comeres terás que morrer”. Finalmente, deve-se notar que uma das características da mitologia levantina aqui representada é a do homem criado para ser escravo ou servo de Deus 1 . Nasce nessa passagem o surgimento do medo no homem, no sentido da punição. Na concepção de uma natureza inicial e primá- ria, da qual se diferencia e à qual se oporia uma cultura, Freud afirma que se houvesse uma “abo- lição da cultura”, o que então restaria seria um estado de natureza (guerra permanente entre os homens). Cabe perguntar se existe ser humano semcultura ou haveria seres humanos mais humanos do que outros. Sendo uns culturais e outros não, haveria então uma es- sência humana por sobre o estado de natureza, a qual seria determi- nada pelo maior desenvolvimento de seu espírito gregário, por maior presença de uma coerção interna- lizada, por uma maior renúncia às suas paixões. Nesse sentido, cabe refletir uma vez mais, sobre o que seria o estado de natureza no sentido filosófico e, sobretudo, as particularidades ima- ginárias e metafísicas, ou, como dissera Freud, preconceitos internosprofundamenteenraizados. Cultura e natureza são à natureza concebidos e imaginados apartir dematrizes filosóficas aceitas inconscientemente como espontâneas, naturais, formando a episteme 2 da cultura de uma época, assim como as filosóficas com as quais Freud se afirmava, mas que, sem dúvida, encontraram repercussão em sentimentos experimentados individualmente em sua relação com o mundo, desde os primórdios dos tempos e de sua vida 3 . Arivalidade entreos dois filhos doprimeiro casal: Oprimogênito, Caim, cultivava terras; Abel,mais novo, era pastor de ovelhas. “Passado o tempo”, conforme sepode ler, “Caimapresentouprodutos do solo em oferenda a Jeová; Abel, por sua vez, tambémofereceu as primícias e a gordura de seu rebanho. Ora, Jeová agradou-se de Abel e de sua oferenda. Mas não se agradou de Caim e de sua oferenda, eCaimficoumuito irritadoe como ros- to abatido”. Caimmatou o irmão e, como castigo, Jeová amaldiçoou-o como já havia amaldiçoado seu pai Adão. “Que fizeste! Ouço o sangue de teu irmão, do solo, clamar para mim! Agora, és maldito e expulso do solo fértil que abriu a boca para receber de tua mão o sangue de teu irmão. Ainda que cultives o solo, elenão tedarámais seu produto: serás um fugitivo errante sobre a terra”. Jeová colocouumamarcanele eCaim“retirou-se da presença de Jeová e foi morar na terra de Nod [= “Errante”], a leste do Éden”. 4 OAssassinato de Abel por Caim: aqui o tema do assassinatonãoprecede,mas sucedeo términoda era mitológica, em contraste com a sequência em todos os mitos primitivos 5 . Além do mais, ele foi transformadoparacriarumaduplicaçãodomotivo da queda. A terra nãomais concederá a Caimsua forçaeeledeveráerrar sobrea sua superfície, oque é, de fato, oresultadoopostoàqueleproduzidopela morte ritualística do mito agrícola, o que mostra que Deus nunca gostou dos agricultores, assim como o atual sistema capitalista. O mito foi aplicado também para elevar os he- breus sobre os povosmais antigos da terra. Caim Segundo o filósofo fran- cês Michel Foucault, episteme é o paradigma comum aos diversos sa- beres humanos em uma determinada época que, porseembasaremnuma mesma estrutura, com- partilham as mesmas características gerais, independentemente de suas diferenças espe- cíficas.

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