Revista da ESPM_JAN-FEV-2012

R e v i s t a d a E S P M – j a n e i r o / f e v e r e i r o d e 2 0 1 2 58 justificar aos seus próprios olhos e aos do povo, o poder do qual estavam revestidos. Inversamente, o medo era o quinhão vergonhoso e comum, e a razão da sujeição dos plebeus. Com a Revolução Francesa, estes conquistaram pela força o direito à coragem. Hoje esta última é sublimada pelo consumismo, drogas e livros de autoajuda. O poema cosmogônico conhecido pelo nome de Enuma elish (segundo as primeiras palavras: “Quando no alto...”). O Enuma elish relata as origens do mundo para exaltar Marduk. Não obstante sua reinterpretação, os temas são antigos. Antes de tudo, a imagem primordial de uma totalidade aquática não diferenciada, em que se distingue o primeiro casal, Apsu e Tiamat. Outras fontes especificam que Tiamat representa o mar, e Apsu a massa de água doce em que a terra flutua. À semelhança de tantas outras divindades originais, Tiamat é imaginada ao mesmo tempo como mulher e bissexuada 9 . Da mistura das águas doces com as salgadas são gerados outros casais divinos. Ignora-se quase tudo sobre o segundo casal, Lakhmu e Lakhamu, de acordo com a tradição, eles foram sacrificados por terem criado o homem. A principal cerimônia do culto na região da Mesopotâmia e também na Grécia era uma refeição que chamavam sacrifício. Seria esta a primeira forma que o homem tenha dado ao ato religioso. Era uma forma de comungar com a divindade 10 . Assim, a religião não residia nos templos, mas nas casas; cada qual tinha os seus deuses; cada deus só protegia uma família e só era deus numa casa 11 . Não se pode razoavel- mente supor que uma religião dessa natureza tivesse sido revelada aos homens, nemensinada por uma casta sacerdotal. Ela nasceu produto da imaginação do espírito humano. Omedo é natural e sempre foi parte de sua sen- sibilidade 12 . Omedo é um componente maior da experiência humana, a respeito dos esforços para superá-lo 13 . “Não há homem acima do medo”, escreve ummilitar, e que possa gabar-se de a ele escapar. Uma guia de montanha a quem se faz a pergunta“aconteceu-lhe sentirmedo?” responde: “Sempre se tem medo da tempestade quando a ouvimos crepitar nas rochas. Isso arrepia os ca- belos debaixoda boina”.Otítuloda obra de Jakov LIND, La Peur est ma Racine , não se aplica só ao caso de uma criança judia de Viena que descobre o antissemitismo. Pois o medo “nasceu com o homem na mais obscura das eras” 14 . O temor ou medo na relação religiosa, ou com o desconhecido, nos remete a outromito fundador, o de Prometeu, um titã de uma raça gigantesca quehabitoua terra. Este tomouumpoucode terra (material sagrado) emisturando-a comágua, fez o homem à semelhança dos Deuses. Deu-lhe o porte ereto, de maneira que, enquanto os outros animais têm o rosto voltado para baixo, olhando a terra como forma de submissão, o homem le- vanta a cabeça para o céu e olha as estrelas. Ele e seu irmão Epimeteu encarregaram-se da obra de criar o homem, e aos animais dar as faculdades necessárias para sua sobrevivência: coragem, força, rapidez, sagacidade, garras a uns, asas a outros, e carapaça protetora para um terceiro. Quando chegou a vez do homem, que tinha que ser superior a todos os outros animais, Epimeteu gastara seus recursos com tanta prodigalidade, que nada mais restara. Perplexo, recorreu a seu irmão Prometeu, que, com a ajuda de Minerva, subiu ao céu e acendeu sua tocha no carro do sol, trazendo o fogo para os homens. Comesse dom, o homem assegurou sua superioridade sobre todos os outros animais. O fogo lhe forneceu o meio de construir armas e ferramentas, comque subjugou os animais e cultivou a terra; aqueceu suamorada, demaneira a tornar-se relativamente independente do clima, e consequentemente tornou-se sedentário 15 . Conclusão Se voltarmos ao nosso passado recente, cons- tataremos que todas as religiões impuseram o medo a Deus no lugar do amor. A República Islâmica do Irã tirou a religião das sombras e mostrou que ela podia atrair uma imensa parce- la da populaçãomundial. Sua vitória horrorizou

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