RJESPM 10

10 JULHO | AGOSTO | SETEMBRO 2014 revista de jornalismo ESPM | cJR 11 No filme Nos Bastidores da Notícia ( Broadcast News , 1987), de Ja- mes Brooks, o repórter e editor Tom Grunick (interpretado por William Hurt) ganha notoriedade, promoção, prêmios e mulheres ao aparecer chorando durante uma entrevista. Na verdade, ele usou recursos de montagem para simular essa emoção, mas isso pouco importa. Existe no jornalismo em geral e no telejornalismo em par- ticular uma compulsão por mostrar ou descrever lágrimas, talvez pela presunção de que quem chora é “autêntico” e de que essas cenas criam forte empatia coma audiência e resulta em sucesso para a matéria e seus autores. Na Copa do Mundo de 2014, não faltaram oportunidades para destacar lágrimas, e os veículos jornalísticos não foram nada tímidos ao explorá-las. Todos os dias, manchetes gene- rosas foram dedicadas aos choros de dor, medo, alegria, tris- teza, civismodos heróis dapátriabrasileiraque se sacrificaram por ela e por todos nós nos gramados nacionais. Muito poucos abriram espaço para outras atitudes, sem lágrimas, como a dos jogadores da seleção da Argélia, que resolveram doar o dinheiro de sua premiação às vítimas pa- lestinas do conflito do Oriente Médio. Os argelinos não chora- ram. Talvez por isso ninguém os notou na imprensa. ■ Copa do Mundo Um vale de lágrimas Asmídias sociais e seus efeitos aindamal diagnosticados nomundo e emespecial no ambiente jornalístico continuamsen- do estudados por acadêmicos emvários países. Abaixo, três pesquisas relevantes divulgadas emmaio. Métrica todo-poderosa Edson C. Tandoc Jr., daNanyang Techno- logical University (Cingapura) e Ryan J. Thomas, da Missouri School of Journa- lism, pesquisaramcomodiversosveículos jornalísticos estão orientando suas dire- trizeseditoriaispelamétricadeaudiência de suasmídias sociais e apontamo risco de eles se deixarem escravizar pela au- diência emvez de iluminá-la edesafiá-la. Com isso, dizem, os veículos podem ser uma barreira à criação de uma comuni- dade emtorno de ideais compartilhados e ao compromisso coletivo coma demo- cracia. Omodelo “centrado na audiência e governado pela lógica de mercado” é eticamente condenável e negligencia o papel crucial do jornalismo de entender o que o público quer e balancear com o que o público precisa, dizem. De perdição a panaceia Philip Schlesinger eGillianDoyle, da Uni- versidade de Glasgow, analisaram por meio de entrevistas em profundida- de com executivos e editores do Daily Telegraph e do Financial Times o processo de transição desses dois jornais de um universo totalmente impressoparaoutro hegemonicamente digital e as tensões ocorridas nas redações durante essas mudanças e até o momento. As mídias sociais, inicialmente encaradas como inimigas e causa das desgraças dos jor- nais passaram a ser vistas por muitos como a salvação do futuro. A conclusão équeéprecisosaber dosar asqualidades dos dois mundos para construir com sa- bedoria o que vem pela frente. No centro de tudo Deen Freelon, Sarah Merritt e Taylor Jaymes, da American University, foram a campoparamonitorar como a impren- sa tratou o papel das mídias sociais nos movimentos Primavera Árabe e Occupy Wall Street, que muitos chamaram de revoluções do Facebook. Constataram que emcercadedois terços dasmatérias analisadas sobre esses assuntos, reco- lhidas em sites de dez jornais represen- tativos, asmídias sociais foramdestaca- das como o centro dos acontecimentos, em especial na Primavera Árabe. Das 795matérias analisadas, 505 diziamque as redes sociais eram instrumentais para os protestos. Essa tendência foi mais incisiva nos meios digitais do que nos meios tradicionais. ■ Novidades na pesquisa Mídias sociais Números fortes 22% dos americanos confiam muito nos jornais nos EUA; em 1979, eram 51% 18% dos americanos confiam nos veículos on-line; em 1999, eram 21% US$ 180 bilhões é o total dos gastos em publicidade nos EUA em 2014, um aumento de 5,3% em relação a 2013, o maior em uma década 80milhões de brasileiros usam o Facebook, o equivalente a 67%da popu- lação urbana; a segundamídia social mais comum no país é o YouTube, com 33% 19% dos americanos confiammuito nos telejornais nos EUA; em 1993, 46% 10% desse total foram para publici- dade em veículos digitais móveis, o que fará essa mídia superar o volume desti- nado a jornais, TV e rádio 18% dos brasileiros dizem que o smartphone é o meio principal pelo qual recebem notícias jornalísticas 22% dos brasileiros pagavam por noticiário digital em 2013, maior porcen- tagem entre os países pesquisados pelo Reuters Institute (EUA: 11%, Espanha: 8%) Fontes: Gallup, eMarketer, Reuters Institute jeff bezos começa a dizer a que veio no Washington Post . O jornal passou a oferecer assinaturas grátis de todo seu conteúdo digital aos assinantes de veículos regionais americanos que se associarema ele nesse projeto. A ideia é aumentar sua audiência, torná-la nacional e, talvez, mundial. Tudo indica ser uma operação em que todos ganham e ninguém perde: para os jornais associados, é uma atração extra para seus leitores; para o Post , umextraordinário aumento de circulação, sem custo adicional para nenhum deles. O presidente do Post , Steve Hills, diz que Bezos mudou a pergunta essencial para os executivos do jor- nal. Antes, ela era: “Como vamos fazer dinheiro nos próximos dois ou três anos?” Agora, é: “Como vamos ter uma grande audiência digital nos próximos dez ou vinte anos?” Entre os jornais regionais importantes que já aderi- ram ao negócio estão Dallas Morning News , Honolulu Star-Advertiser , Toledo Blade , Minneapolis Star Tribune , Pittsburgh Post-Gazette e Milwaukee Journal Sentinel . O Post sob o comando da família Graham tinha como dístico “Um jornal para Washington e sobre Washing- ton”. Ele estava empraticamente todas as casas da cidade e vizinhanças durante décadas e concentrava quase toda carlos eduardo lins da silva é livre-docente, doutor e mestre em comunicação; foi diretor-adjunto da Folha de S.Paulo e do Valor . a associação mundial de Jornais divulgou em junho um“manifesto por uma aliança internacional emfavor da pesquisae inovaçãonosmeiosdecomu- nicação”. Segundo seus idealizadores, que a indústria necessita com urgên- cia de um esforço bem-sucedido para entender as condições do ambiente em que opera e para desenhar saídas para impasses a que está submetida. O “ecossistema de inovação” que ide- almente derivará desse projetodeve se desenvolver em torno de quatro pila- res: a visão estratégica compartilhada que está expressa no manifesto, um processo de treinamento e aconselha- mento, a coprodução de serviços e tec- nologias emparceria comomundo da pesquisa e transferência de tecnologia cominterface específica entre editores, provedores de tecnologia e startups. O nome do projeto é “Media Inno- vationHub” e seu objetivo principal é acelerar mudanças na indústria para que ela possa enfrentar a dura reali- dade atual (omanifesto lembra que na Europa a circulação paga dos jornais caiu 25%entre 2008 e 2012 e nos EUA o faturamento publicitário decresceu 42% no período). A ideia é apresentar seus primei- ros resultados no prazo de um ano. Do Brasil, fazem parte o grupo RBS e a Pontifícia Universidade Cató- lica do Rio Grande Sul. Entre outros, participam a Agência France-Presse, a Universidade Vrije de Bruxelas e a Escola Politécnica Federal de Lau- sanne (Suíça). ■ Pela pesquisa e inovação Bezos muda a pergunta Veículos Bezos quer transformar o jornal The Washington Post em marca mundial sua cobertura nas questões locais e nas nacionais origina- das na capital. Essa era a força de sua receita e o motivo de orgulho de seus editores. Agora, a rota é diferente. O objetivo é seguir a linha de outros veículos que se internacionalizaram antes, como The New York Times , The Economist e Financial Times . A ideia é fazer do Post uma marca mundial e aumentar seu faturamento publicitário e de assinantes graças a isso. ■ Richard Brian/ Latinstock

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