RJESPM 10
26 JULHO | AGOSTO | SETEMBRO 2014 revista de jornalismo ESPM | cJR 27 logy (MIT). O centro de produção do ITP fica num espaçoso loft no sul da ilha de Manhattan, onde num desses encontros o instrutor BenMoskowitz conduzia oito alunos numa explora- ção do uso de drones para novas for- mas de narrativa jornalística. Moskowitz tem27 anos. Éumrapaz magro, intenso. Naquele dia, vestia um moletom cinza listrado. Quando fez uma ligação pelo Skype para Lon- dres, Hannen, da BBC, apareceu na tela. A conexão lenta não arrefeceu o entusiasmo de Hannen pelo tema. Umdos vídeos exibidos à turmamos- trava um close espetacular da estátua do Cristo Redentor no Rio de Janeiro, que Hannen filmara para incluir no pacote da cobertura da Copa no Bra- sil. “Dá quase para ver as marcas de cinzel do escultor. Sem falar, é claro, da perspectiva da cidade lá embaixo, que vai mudando, e das nuvens”, flo- reou Hannen antes de responder a perguntas dos alunos e deMoskowitz. Moskowitz começou a dar aulas sobre drones depois de conduzir um simpósio patrocinado pela MacAr- thur Foundation no ano passado sobre o uso desses aparelhos por civis. Durante três dias, o evento reu- niu no campus da NYU fabricantes de drones, especialistas do meio acadê- mico, das Forças Armadas e da mídia – alémde centenas de outros interes- sados. Graças ao sucesso do congresso, Moskowitz foi convidado para lecio- nar uma disciplina dedicada ao jor- nalismo-drone. O que lhe interessa particularmente é explorar a subver- são da finalidade original da tecno- logia. “A internet foi projetada para que no caso de um ataque nuclear o comando das Forças Armadas [ ame- ricanas ] pudesse seguir se comuni- cando”, observa. “Aí veio a turma barbuda que usava LSD em Stan- ford e Berkeley e botou as mãos na tecnologia. Essa contracultura pro- pôs a visão alternativa do computa- dor que acabou dando no computa- dor pessoal.” Tecnologia é ferramenta Embora não se considere jornalista – o rapaz bate ponto naMozilla, a orga- nização sem fins lucrativos que criou o navegador Firefox e exalta as virtu- des da internet aberta –, Moskowitz começou a estudar o poder da tecno- logia no relato de notícias. “A ideia é achar possibilidades jornalísticas interessantes. Pode ser uma prova de bicicleta ou um comício – é possível cobrir o acontecimento com essa tec- nologia?”, questiona. “Se não for, bola pra frente. Não queremos que a tecno- logia seja o cavalo que puxa a carroça. É só mais uma ferramenta no instru- mental. E acho que é assim que deve ser. Não deve haver uma inclinação pela nova tecnologia.” Na disciplina deMoskowitz, o aluno tem de criar uma reportagem para publicação na internet com o uso de um drone, o que inclui a apuração, o planejamento, a operação do apare- lho e a edição do material. Há vários drones para uso pela turma. Dia des- ses, depois da aula em sala, os alunos foram com Moskowitz a um parque ali perto. Numamaleta preta, levavam o drone que usariam. Solucionados alguns problemas téc- nicos, a câmera levantou voo. “Está meio irregular [ o voo ], não sei por quê”, comentouMoskowitz enquanto o drone branco ganhava altitude, zunindo e zanzandode lá para cá como umenxame de abelhas. Quempassava por ali parava para olhar. Várias pes- soas tiraram fotos ou filmaram a cena como celular; alguns foramperguntar a Moskowitz qual o alcance do apa- relho, quanto custava. Dois alunos, Daniel Soto e Kristina Budelis, se revezavam no comando do drone, mantendo a engenhoca por perto e a menos de 7 metros do solo. Quando um funcionário do parque se aproximou do grupo e pediu que dei- xassem o local, Moskowitz foi logo desmontando o aparelho, sem nunca abandonar o tom cordial. Satisfeito com o restabelecimento da ordem, o funcionárioseguiucaminho. “Énormal quando estamos mexendo com dro- nes. Mas eles mandam. Com o skate também é assim: se o parque diz que é proibido andar de skate ali, é proi- bido e ponto”, explica Moskowitz. Com essa filosofia, o professor pode, ao menos, ter ganhado tempo. Enquanto os cursos nas universidades de Nebraska eMissouri foram encer- rados, até aqui o da NYU segue firme. Raphael Pirker é uma figura polê- mica na comunidade de usuários de drones. Seus lances cinematográfi- cos – colocar umdrone para girar em torno da Estátua da Liberdade, outro para voar sob os arcos da ponte Gol- den Gate – lhe renderam tanto admi- ração quanto a alcunha de “anarquista aéreo”. Um vídeo seu, das pontes de Nova York, foi vistomais de 2milhões de vezes no YouTube. Pirker atrai público pela alta qualidade das ima- gens e pela coragem de peitar a FAA; já para os críticos, não passa de um exibido cujas peripécias atraem uma atenção indesejável para o uso de dro- nes por civis. Ao falar sobre o assunto, o austríaco de 29 anos parece bastante à vontade no papel de agent provoca- teur . Há pouco, no entanto, Pirker se tornoumais do que isso: virouo sujeito que poderia inaugurar uma nova era para o jornalismo-drone. Em 2011, Pirker foi procurado por uma firma de marketing que queria usar seu drone para gravar tomadas aéreas da University of Virginia para um vídeo promocional. No dia da fil- magem, vários funcionários da uni- versidade, incluindo do setor de segu- rança, seguiram Pirker pelo campus para garantir que as normas da ins- tituição fossem respeitadas. Assim que o vídeo foi postado na internet, no entanto, a FAA tascou uma multa de US$ 10 mil no rapaz. “Decidi estudar a legislação ame- ricana. Não demorou para concluir que não havia nenhuma lei [ que jus- tificasse a medida ]”, disse Pirker por telefone de Hong Kong, onde vive atualmente. “Como sou o piloto mais famoso dessa comunidade, a impres- são é que eles quiseramdar umexem- plo para assustar as pessoas.” Questão de segurança Se essa foi de fato a intenção, o tiro saiu pela culatra. Em março, um juiz da National Transportation Safety Board (NTSB, o órgão americano res- ponsável pela segurança nos trans- portes) revogou a multa sob a tese de que a FAA não tem autoridade legal para impor ou fazer cumprir o veto de pequenos drones. A FAA imedia- tamente entrou com recurso. Em seu site, segue o alerta: “As normas da FAA não são abertas a interpretação. Quem quiser fazer voar uma aeronave – tri- pulada ou não – no espaço aéreo ame- ricano precisa de algum tipo de auto- rização da FAA”. Pirker afirma não ser contra a exis- tência de normas. “Seria uma opor- tunidade muito boa para que ado- tassem regras sensatas”, declarou. Se a decisão do juiz for confirmada pela cúpula do NTSB, o veto federal poderia cair. Brendan Schulman, advogado de Pirker e ele próprio um usuário assí- duo de drones, concorda que há ques- tões de segurança a resolver, mas acha que a gritaria inicial a respeito da pri- vacidade e da bisbilhotice é exage- rada. “Os cenários sobre os quais li – tirar fotos através de janelas ou espio- nar as pessoas no seu próprio quintal – já são previstos na legislação atual de privacidade”, diz. “O ato ofensivo é fotografar alguém que esteja num espaço privado, não a tecnologia. Se tiro uma foto do lado de fora de uma janela, não deveria importar, do ponto de vista jurídico, se uso um cabo de vassoura ou um drone.” ■ louise roug é repórter e editora freelance em Nova York. Seu Twitter é @louiseroug. Chamada de câmera voadora pela BBC, a máquina registra ângulos exclusivos Texto originalmente publicado na edição de maio/junho de 2014 da CJR.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NDQ1MTcx