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50 julho | agosto | setembro 2014 revista de jornalismo ESPM | cJR 51 rização do patrimônio da família Xi. “Pouco antes de a matéria ser publi- cada, a muralha que separa a reda- ção do comercial cedeu”, disse uma fonte, segundo a qual parte da equipe de reportagem ficou seriamente con- trariada com a decisão. A reportagemda CJR tentou ouvir gente da Bloomberg – incluindo Grauer, Doctoroff e Winkler – para este artigo. Por e-mail, pedimos deta- lhes sobre as conversas travadas com diplomatas chineses e perguntamos se, nas decisões tomadas pela empresa, interesses comerciais tinham preva- lecido sobre a área editorial. Sem esclarecimentos Grauer não respondeu. Um assessor de imprensa disse que Doctoroff não daria declarações. JáWinkler respon- deu: “Agradeço o interesse. Assimque puder, entrarei em contato”. A certa altura, outro assessor, TyTrippet, ligou para nossa reportagemcomo seguinte discurso: “Veja bem, para falar sobre boatos, sem saber ao certo o que você está tentando dizer, fica difícil conse- guir que alguém [ da Bloomberg ] fale comvocê”.No fimdas contas, ninguém da agência quis prestar esclarecimen- tos para esta matéria. Enquanto isso, pouco antes da data marcada para a nova matéria sobre Xi sair, Forsythe, o principal respon- sável pela redação do texto, que na épocamorava emBeijing coma famí- lia, começou a receber ameaças de morte. Aprimeira foi transmitida indi- retamente – por um especialista em China na Columbia University que relatava uma conversa que tivera com um conhecido chinês. A mensagem, vaga, era que Forsythe deveria se cui- dar. Depois disso, Forsythe recebeu um recado parecido, dessa vez por intermédio de outro correspondente estrangeiro em Beijing. “O que mais me perturbou foi que quando começamos a receber amea- ças demorte a Bloomberg avisou que estávamos proibidos de falar sobre o assunto”, disse amulher de Forsythe, Leta Hong Fincher, outra acadêmica especializada emChina. Fincher com- parou a reação da Bloomberg à pres- são de autoridades chinesas coma do NewYorkTimes meses depois, quando da publicação de sua premiada repor- tagem sobre a China. Segundo ela, enquanto o Times falou abertamente sobre odesafiode fazer umjornalismo de denúncia na China, a Bloomberg buscou abafar a discussão. Desde a publicação das respectivas reportagens, as duas empresas tiveram de conviver com a censura do traba- lho que fazem na China. Para o New York Times , isso signi- ficou o bloqueio de um projeto carís- simo – um site emmandarimvoltado sobretudo ao mercado chinês – e a dificuldade para conseguir vistos de residência para repórteres, sobretudo para quem chega ao país para substi- tuir o pessoal de saída. A resposta à pressão oficial parece variar de acordo com os interesses de cada empresa no mercado chinês. Fincher mencionou uma coluna de dezembro de 2013 da ombudsman do New York Times , Margaret Sulli- van. Nela, Sullivan chama de “estoica” a postura do jornal diante de reve- ses como aquele. Segundo a ombu- dsman, o publisher do diário, Arthur Sulzberger Jr., teria dito que o New York Times não se deixa “intimidar”. Fincher contou que a Bloomberg ameaçaramover uma ação contra ela, mas que, diferentemente do marido, ela não temnenhumacordo de confi- dencialidade coma agência. A coluna de Sullivan foi publicada poucodepois de relatos de que a Bloomberg teria derrubado a última reportagemsobre a corrupção na China. Olhando hoje, gente que trabalhou nessa nova empreitada da agência diz que o colapsodamuralha entre a reda- ção e o comercial na reportagemsobre Xi Jinping no ano anterior teria sido um ensaio para o tratamento dado ao novo projeto. Altos executivos da empresa voltaram a palpitar sobre o material nos estágios finais da reda- ção – só que, dessa vez, com resulta- dos muito mais dramáticos. Segundo e-mails trocados emmeados de outu- bro, e a cujo conteúdo tive acesso, isso ocorreudepois deumexecutivodeum banco de investimentos estrangeiro com operações na China ter comen- tado comumrepresentante de vendas da Bloomberg que a conexão dos ter- minais de dados da empresa na China andava lenta – e que ficara sabendo que a Bloomberg estava para soltar outra denúncia “bombástica” sobre o país. Na China, quando a censura suspeita de que algum fato politica- mente delicado está por vir, é comum a velocidade da internet cair. Outras fontes sugerem que os executivos da Bloomberg, e o pessoal de vendas em particular, podemter ficadopreocupa- dos com o novo projeto antes mesmo dessa conversa. Relação delicada Ummembro da equipe da Bloomberg que trabalhava na apuração da maté- ria me contou que um editor sênior lhe dissera ter recebido um telefo- nema do setor de vendas, que que- ria saber “o que estava acontecendo”. Dessemomento até amatéria ser der- rubada, foi tudo muito rápido. Todos os entrevistados para este artigo disse- ram que a Bloomberg tomou todos os cuidados para não deixar as digitais de ninguémnadecisão.Umadessas fontes concluiu: “Nunca subestime a ligação que há entre os executivos da redação e o pessoal de vendas na Bloomberg”. A chefia não deu grandes explica- ções – além do medo de que jorna- listas da Bloomberg fossem expulsos da China, manifestado por Winkler – para o fato de estar derrubando a matéria. Aliás, chegou a negar publi- camente que isso estivesse ocorrendo. Adesculpa foi que omaterial simples- mente “não estava pronto”. “Ninguém nunca explicou clara- mente qual foi o problema”, disse um repórter, que não quis ser identi- ficado. Richardson, o ex-editor espe- cial, disse que, embora o trabalho de apuração ainda não estivesse con- cluído – faltava ouvir o lado de per- sonagens chineses citados na maté- ria, por exemplo –, a desculpa de que o material “não estava pronto” era uma tecnicidade vazia. Uma evasiva, nada mais. Richardsondissequeorevés sofrido pela equipe deProjetos e Investigação, o corte ou remanejamento de repór- teres da área de negócios e a saída de Bennett não eram um bom augúrio para o futuro do jornalismo investi- gativo na Bloomberg. “Se se permi- tir que esse tipo de coisa ocorra, com certeza não haverá recursos suficien- tes para fazer matérias como as que fizemos em 2012”, garantiu. Dias depois da nossa correspondên- cia inicial por e-mail, Winkler, dire- tor de redação da agência, mandou sua única declaração para esta maté- ria: “Tenho orgulho de nossa repor- tageme nosso trabalho fala por si só”. Questionado por e-mail se a decla- ração valia para o segundo projeto investigativo sobre a corrupção nas altas esferas da China, agora aparen- temente morto e enterrado, Winkler respondeu: “A declaração vale para nosso trabalho”. ■ howard w. french é professor associado da faculdade de jornalismo da Columbia University. De 2003 a 2008, foi chefe da sucursal do New York Times em Xangai. Seu último livro, China’s Second Continent: How a Million Migrants Are Building a New Empire in Africa , foi lançado em maio deste ano. No momento, French escreve um livro sobre a geopolítica no Leste Asiático. Segundo uma fonte, a ligação histórica estabelecida entre os executivos da redação e o pessoal de vendas na Bloomberg não pode ser subestimada Texto originalmente publicado na edição de maio/junho de 2014 da CJR.
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