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revista de jornalismo ESPM | cJR 33 Os hackers têm habilidades para acompanhar a velo- cidade e a quantidade de dados gerados a cada segundo. Podem criar soluções para encontrar informações onde imperamos bloqueios à transparência. Hackers, emgeral, atuam com a inteligência à procura do que não é comum, incentivam o improviso e a exploração de possibilidades inusitadas,muitas vezes perseguindo trajetos considerados equivocados. Emummundo organizado por softwares, os hackers adquirem uma grande importância. Ainda mais quando, bem alertou Galloway no livro citado, o código contido nos programas computacionais “is the first lan- guage that actually does what it says – it is a machine for converting meaning into action” 4 . A tecnologia não é mágica, não é neutra e guarda as determinações de seus programadores. Hackers sabem que softwares contêm as rotinas que seus desenvolvedo- res definiram. As pessoas comuns chegama “naturalizar” o software, como se brotassem tal como árvores. Descon- sideram que os softwares possuem um código-fonte que os define e que são formados por linhas de programação – e cada uma delas “faz o que realmente diz”. Os hackers buscam conhecer os softwares, suas qualidades e suas fragilidades. Émais fácil para umhacker entender o con- ceito de dispositivo de Foucault (para o filósofo um dis- positivo é umconjunto de estratégias de relações de força que condicionamcertos tipos de saber e por eles são con- dicionados) do que um aluno de ciências sociais deslum- brado comas funcionalidades de um gadget . Ohacker sabe o poder que um código possui, uma vez que pode limitar ou ampliar o que as pessoas fazem com seu computador ou com as informações que reuniu. Assimchegamos ao ponto emque é necessário desmis- tificar o hacker e todo o maniqueísmo criado em torno de sua prática. Existe um glossário online de termos hackers muito influente chamado The Jargon File . Nele, o “hacker” é definido como “a personwho enjoys exploring the details of programmable systems and how to stretch their capabilities, as opposed tomost users, who prefer to learn only the minimum necessary. RFC1392, the Inter- net Users’ Glossary, usefully amplifies this as: A person who delights in having an intimate understanding of the internal workings of a system, computers and computer networks in particular” 5 6 . A cultura hacker nasceu nos anos de 1960 e foi muito influenciada pelos valores libe- rais, anarquistas e pela contracultura americana, princi- palmente pelos movimentos pacifistas e contrários à con- centração de poder. Ética hacker Uma das principais estudiosas do universo hacker é a antropóloga Gabriella Coleman. Ela escreveu em con- junto com o professor Alex Golub um texto fundamen- tal para entender as influências constitutivas da cultura hacker chamado “Hacker Practice: Moral Genres and the Cultural Articulation of Liberalism” ( Anthropological Theory, setembro de 2008, volume 8). Coleman identifica três tipos de prática hacker: a primeira é ligada ao uso da criptografia e das técnicas de segurança para a proteção da privacidade e liberdade dos indivíduos, denominada cryptofreedom ; a segunda se organiza em torno do desen- volvimento de software livre e do código-fonte aberto que incentiva o compartilhamento do conhecimento; a terceira vincula-se ao universo underground e desconsi- dera os limites da lei. A habilidade e talento dos hackers para lidar com códigos e os conflitos na sociedade infor- macional revelam tensões da natureza heterogênea da sociabilidade hacker com a tradição liberal. Isso implica uma ética hacker como uma constelação de deslocamen- tos, com sobreposições e traduções de um gênero moral em outro, de uma prática em outra, redundando muitas vezes em discursos contraditórios. Caminhando em outra perspectiva, Pekka Himanen escreveu um texto sobre a ética hacker e o espírito da era informacional chamado The EthicHacker and the Spirit of the Information Age (Random House Trade Paperbacks, 2001). Sua narrativa dialoga diretamente com o impor- tante livro de MaxWeber, a Ética Protestante e o Espírito 4 Tradução do autor: “... é a primeira língua que faz o que realmente diz – é uma máquina de conversão do significado em ação”. 5 Tradução do autor: “Uma pessoa que gosta de explorar os detalhes de sistemas programáveis e de como expandir as suas capacidades, ao contrário da maioria dos usuários, que preferem aprender apenas o mínimo necessário. A RFC1392, glossário dos usuários da Internet, amplia essa definição para: uma pessoa que se deleita em ter uma compreensão profunda do funcionamento interno de um sistema, computadores e redes de computadores, em particular.” 6 Disponível: http://catb. org/jargon/html/H/hacker.html Acesso 26/01/2015.

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