RJESPM 12
revista de jornalismo ESPM | cJR 43 Texto originalmente publicado na edição de novembro/dezembro de 2014 da CJR. Há histórias mais significativas, como as que tratam de zoneamento e levam em conta a divisão racial e programas pagos pelo governo O que Khalilah Harris, a autora do tweet, não sabia, é que antes de a série ir ao ar, os cinco membros da equipe do Maryland Morning eram brancos. (Antes de a série começar, contrata- mos uma jornalista negra em regime temporário. Mais tarde ela foi efeti- vada, e seu auxílio paramatérias além da desigualdade se tornou essencial.) Fracasso da imprensa Comunidades negras e portais de notí- cias vêmdiscutindo a natureza estru- tural da desigualdade racial por toda a história americana, desde antes de Ida B. Wells definir o linchamento como “ummeiode se livrar de crioulos (no original, é usado o termo racista ‘negroes’) que estejam adquirindo bens e riquezas e assimmanter a raça aterrorizada”. O fracasso da grande imprensa emmiscigenar as redações, apesar das décadas prometendo fazer isso, é um obstáculo para cobertu- ras desse tipo. Mas mesmo a redação mais inclusiva tambémdeve fazer um exame de consciência. Eu considerei o comentário de Diane Bell-McCoy e o tweet de Kha- lilahHarrismuitoúteis – elesmemos- traramo tomque tínhamos que adotar. Como uma equipe majoritariamente branca, decidimos nos expor aberta- mente, ao abordar a conversa mais difícil sobre questões raciais, tanto na produção quanto no momento de ir ao ar – e ao receber as críticas –, em vez de fugir delas. Váriosmembros da comunidade toparamnos ajudar como consultores, incluindoumpolicial, um ex-presidiário e umtreinador antirra- cismo. Nossas conversas, e o feedback dos consultores ao longo da série, às vezes eramdesconfortáveis, mas acho que elas melhoraram muito o traba- lho. Nós nos sentimosmuitomais res- ponsáveis por como a nossa descri- ção de um bairro, uma pessoa ou um assunto podia ser entendida ou sen- tida por pessoas de diferentes raças e classes sociais. Essas conversas ins- piraram um dos trechos mais fortes que gravamos, o depoimento de um jovemativista negro chamadoDayvon Love dizendo que os brancos que ten- tam “arrumar” bairros negros estão “lucrando” comadesgraçada comuni- dade negra. “Se você não está disposto a seguir uma liderança negra para abordar nossas questões”, Love disse, “você me atrapalha”. Uma discussão crua e honesta – pelomenos para uma cidadezinha, segundo McCoy, “edu- cada” ao falar de raças – começou no site logo depois. Um ano e meio mais tarde, Love e seus companhei- ros ainda estão pressionando os líde- res civis da região a questionarem o “complexo industrial sem fins lucra- tivos” de Baltimore. Também foi importante sair dos escritórios e arquivos e entrar nas comunidades. Bell-McCoy – que, ao fim de nossa conversa telefônica, foi a primeira a se comprometer a nos financiar – me convidou para um seminário no qual as lideranças civis da região de Baltimore discutiram os fatores estruturais que moldam a desigualdade racial. Issome ajudou a construir umsuporte conceitual para a série, e as histórias de dois palestran- tes se tornaram algumas das melho- res partes do projeto. Conforme ouvíamos pessoas que não podiam escapar do choque com a realidade de raça e pobreza, ficou claro para mim o meu privilégio de branco de classe média, que pode escolher evitar essas realidades. Essa compreensãome encorajou a enfren- tar esse conflito mais diretamente como repórter. É fácil errar nesse caminho. Você temque atingir umpúblico que inclui tanto quem fica na defensiva ao falar de racismo como quem pensa: “Você chegou tarde, mas valeu a tentativa”. E a tentativa não dá direito a uma orientação paciente e gentil. Como uma usuária do Twitter chamada @FeministGriote escreveu em mea- dos de 2014 sobre brancos que que- rem aprender sobre igualdade racial: os negros “estão ocupados demais ten- tando sobreviver para ficar o tempo todo ajudando vocês”. ■ lawrence lanahan é jornalista freelance em Baltimore.
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