RJESPM 12

revista de jornalismo ESPM | cJR 73 aquestãodasegurançapessoal assumia dimensões distintas. Emoutros confli- tos, um jornalista em geral pode cali- brar, até certo ponto, o grau de risco que quer correr. Não raro, pode deci- dir quando se aventurar até a linha de frente. Mas imagens de satélite divul- gadas pela ONU mostraram edifícios danificados e destruídos por toda a Faixa de Gaza. Vários jornalistas com quem falei disseram que, ainda que ficassememhotéis conhecidosdurante a noite e circulassememcarros identi- ficados com um “TV” ou “Imprensa” durante o dia, não havia nenhuma garantia de segurança. “Em Gaza, nãohá linha de frente”, informaAbdel Kouddous. “Gaza é a linha de frente.” É claro que o risco de trauma faz parte do trabalho do correspondente de guerra. Além disso, os jornalistas que forama Gaza no ano passado não eram novatos. Até correspondentes tarimbados, no entanto, sentiram ter chegado a um limite. Em2009, Tadros eMohyeldin só não deixaramo lugar porque sabiamque nãohavia ninguém para substituí-los. Em 2014, com a guerra se arrastando cada vez mais, foi constante o rodízio de jornalistas estrangeiros. Vários repórteres rela- taramummisto de esgotamento físico e desgaste emocional causado pela exposição diária aos horrores do con- flito e pela sensação de que era impos- sível escapar da violência. “Gaza cau- sou um estrago em repórteres como nenhuma outra situação que já pre- senciei”, afirmaDannyGold, jornalista da Vice News que cobriu o conflito. Grande controvérsia Enquanto trabalhavam sob fogo de verdade emGaza, jornalistas também foram alvo do bombardeio retórico de conservadores e de movimentos pró-Israel. Eram acusados de ceder à pressão doHamas e de nãomostrar imagens de combatentes palestinos ou de não noticiar o suposto uso de escudos humanos. Em agosto, o pre- miê israelense, BenjaminNetanyahu, disse que quando a imprensa interna- cional fosse embora deGaza, esperava ver “mais registros de terroristas do Hamas se ocultando atrás da popu- lação civil, explorando alvos civis”. A previsão do primeiro-ministro não se materializou – e jornalistas que cobriramo conflito emGaza clas- sificaramde infundada a acusação de que oHamas fizera pressão. A grande controvérsia era se tinham ou não se empenhado emmostrar facções arma- das emGaza. E, com efeito, salvo por um vídeo produzido por uma equipe de TV indiana, poucos relatos tra- ziam imagens de militantes palesti- nos em ação. Repórteres e fotógrafos que entre- vistei deramamesma explicação para essa ausência de imagens de homens armados: não havia contato comcom- batentes doHamas e da jihad islâmica. Muitos estavam escondidos. Os que combatiam não tinham tempo para falar. “Queríamos mostrar esse lado”, declara Danny Gold, da Vice . “Fomos ameaçados? Fomos alertados? Não. Mas tampouco tivemos acesso.” Emvez de falar do autoritarismo do Hamas, jornalistas em Gaza se con- centraram no fato mais imediato: a campanha militar que ocorria a sua volta. Permitir a entrada de jornalis- tas estrangeiros em Gaza durante a ofensiva foi, de certo modo, um erro de cálculo de Israel. “Os israelenses acharam que seria muito mais fácil desacreditar oHamas oumostrar sua crueldade se deixassem [ repórteres ] entrarem”, acrescentaNoamSheizaf. Para Ayman Mohyeldin e Sherine Tadros, cobrir Gaza em 2014 foi vol- tar a um lugar que conheciam intima- mente – e vê-lo aindamais devastado do que da última vez que estiveram ali. “A infraestrutura do lugar já tinha passado por uma guerra em 2008 e 2012”, dizMohyeldin. “Equando digo infraestrutura não me refiro apenas à infraestrutura física. Estou falando da capacidade psicológica das pes- soas de suportar isso. Hoje, há crian- ças de 8, 9 anos de idade que já vive- ram três guerras.” ■ jared malsin é jornalista independente radicado no Cairo, Egito. Os correspondentes relataram que o contato íntimo com a morte e com o sofrimento das famílias foi a parte mais dura do trabalho na região Texto originalmente publicado na edição de novembro/dezembro de 2014 da CJR.

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