RJESPM 14.indb

revista de jornalismo ESPM | cJR 35 jovens americanos. Épossível abordar causas políticas ou humanitárias na grande mídia por meio da persuasão, mas elas são mais eficazes se acom- panhadas por um bom componente visual, e de umponto de vista comque o público se identifique. Documentários são os verdadei- ros “reality shows”, e, como todo fã desses programas sabe, a realidade é uma forma de ficção. O jornalismo também é uma modalidade de fic- ção, pois reorganiza os fatos em uma história, enfatizando alguns pontos e menosprezando outros. A “realidade” da natureza se transformou em algo radicalmente diferente em Virunga , o documentário de 2014 da Netflix, que foi premiado. O cineasta Orlando von Einsiedel descobriu caçadores desesperados, corrupção de empre- sas petrolíferas e guardas florestais heroicos enquanto filmava um docu- mentário tradicional sobre os gorilas doParqueNacional Virunga, naRepú- blica Democrática do Congo. Os fatos se organizaramemuma nova história. O jornalismo não é mais a simples narrativa dos fatos, se é que foi isso algumdia. E, conforme cresce a impor- tânciado storytelling para atrair eman- ter a atenção dos leitores, seria difícil encontrar alguémque defenda a supe- rioridade moral do impresso sobre o filme. Laura Poitras, a diretora pre- miada de Citizenfour (filme de 2014 que abordaoescândalode espionagem pela agência americana NSA e como se deram os encontros comEdward Snowden), disse recentementeemuma conferência durante o festival de Sun- dance que os documentários são um “jornalismocomumplus”: umacombi- nação de apuração, storytelling e “ten- tar abordar questões maiores sobre a condição humana”. Restrepo , deSebas- tian Junger, estámais para “jornalismocom umplus duplo”. Éum pacote completo: artigos para a Vanity Fair deramorigemao livro War , ao docu- mentário que Jun- ger fez com o fotó- grafo de guerra Tim Hetherington (morto em 2011, durante a cobertura da guerra na Síria), e a Koren­ gal , sua sequência de 2014. Vários lados da história foram abor- dados nos noticiá- rios, na National Geo­ graphic e em outros lugares. Restrepo é um modelo de jor- nalismo que não é impresso e também não é literário, mas reúne as caracterís- ticas de ambos. Ele atraiu a atenção de leitores e espectado- res,mesmoque tenha arrecadado menos que Fahrenheit 9/11 . Isso não signi- fica que bilheteria e audiência tenham uma relação direta. Uma ótima história não é sufi- ciente: alguém tem que levá-la até o público. E, para o marketing, o filme é bem melhor que o impresso. Anna Godas, distribuidora de documentá- rios britânica, disse em uma entre- vista para a Economist que “é pre- ciso capitalizar no elemento dramá- tico intrínseco do filme”. Ela explica melhor: “Quando lançamos Restrepo , podíamos ter contado sobre a trágica investigação da vida de um soldado no Afeganistão. Em vez disso, demos o tom de um filme de ação, que tem muito mais apelo”. Algumas vezes, até “uma forma melhor da verdade” pode ser melhorada. ■ richard gehr escreve para a Rolling Stone e para o Village Voice , entre outras publicações. Seu livro mais recente é I Only Read It for the Cartoons: The New Yorker’s Most Brilliantly Twisted Artists (Eu Só Leio as Figuras: Os Artistas mais Loucos e Brilhantes da New Yorker). Tim Hetherington Reprodução Reprodução Texto publicado no site www.cjr.org em 27 de maio de 2015. Restrepo (2010), de Sebastian Junger e Tim Hetherington Virunga (2014) tem a direção de Orlando von Einsiedel Blackfish (2013), documentário de Gabriela Cowperthwaite

RkJQdWJsaXNoZXIy NDQ1MTcx