RJESPM 14.indb

36 Julho | agosto | setembro 2015 num dia abafado nos idos de 1880 , o jornalista e fotógrafo Jacob Riis foi parar num insalubre cortiço na cidade de Nova York, na Mott Street. Ali, viu uma família sentada ao redor de uma garotinha inerte, que respirava com difi- culdade. Tinham o olhar perdido de quem já não crê em nada. A menina não estava doente, nem ferida. Seu mal era inanição. O pai tinha as mãos deformadas por uma intoxicação por chumbo. Uma infecção ocular corriqueira deixara a mãe e uma das quatro crianças prati- camente cegas. Sem poder trabalhar, a família vivia de esmolas. No deses- pero para que a menina recobrasse as forças, tinham tentado fazê-la beber um refresco: uma ginger ale , comprada com grande sacrifício. Riis descreveu a família no livro How the Other Half Lives ( Como Vive a Outra Metade , em tradução livre). Pela primeira vez na vida, muitos de seus abastados leitores viam de perto a face da fome – ali, em sua própria cidade. Textos sobre o slumming – relatos voyeurísticos da vida nas entranhas da cidade – não eram raros nos jornais da época, mas em geral não passavam de por lene bech sillesen, chris ip e david uberti material sensacionalista sobre a vio- lência e a indecência em que vivia a população de baixa renda. Eram tex- tos que corroboravama tese comumde queopobreeramoralmente inferior ao rico e culpadopelopróprio infortúnio. Já Riis buscou humanizar o pobre. E conseguiu. Como poucos antes dele, o fotógrafo despertou simpatia e com- paixão por gente normalmente des- prezada, ignorada ou incompreendida pela sociedade. Embora Riis sejamais lembrado como fotógrafo, tanto sua obra fotojornalística quanto seus tex- tos para publicações tiveram impacto. O poder da emoção Como a migração do impresso para o digital mexe com a nossa capacidade de estabelecer empatia com personagens e situações Homem solitário na ilha de Creta devotado à leitura do jornal diário

RkJQdWJsaXNoZXIy NDQ1MTcx