RJESPM 14.indb
revista de jornalismo ESPM | cJR 39 compersonagens de relatos jornalís- ticos, como certas pesquisas sugerem. Nossa análise tem como ponto de partida um exame do cruzamento da pesquisa científica sobre empa- tia, comportamento e cérebro. Em seguida, iremos relatar como a nar- rativa desencadeia a empatia. Por último, vamos explorar os efeitos da leitura digital. O resultado lançará luz sobre as possíveis consequências do impacto demídias digitais na empatia, o que poderia ter profunda influência no futuro do jornalismo. Mas, afinal, o que é empatia? Imagine que você, leitor, tenha sido brindado com o poder de ler a mente alheia. Ou seja, que é capaz de saber a opinião da barista sobre sua pessoa quando você sai do recinto semdeixar gorjeta. Ou de saber que o sujeito a sua direita levou um fora e que amulher à esquerda perdeu o pai há pouco. Você é bombardeado por emoções: tris- teza, raiva, alegria. Como usaria essa informação? Ainda que não seja literalmente capaz de ler o que o outro está pen- sando, você se aproxima muito disso – mais do que imagina. E o faz por meio da empatia. Tanto a psicolo- gia como a neurociência veem nisso uma inclinação natural do homem à “leitura cotidiana da mente”, uma tradução livre do título em inglês ( everyday mind reading ) de um livro deWilliam Ickes, professor de psico- logia daUniversity of Texas emArlin- gton, e a fórmula usada por Ickes para descrever a empatia. Sua tese é que a empatia é algo muito parecido com ler a mente alheia; é a capacidade de mapear o terreno emocional e men- tal do outro com base em sua lingua- gem verbal e corporal. Ainda que não ouça os impropé- rios que a barista desfere contra sua pessoa, você a vê fechar com raiva a gaveta do caixa. A leitura cotidiana da mente é baseada na inferência – em imagi- nar o que o outro “deve” estar pen- sando e sentindo em determinado momento. Éuma faculdade natural do ser humano e, quanto mais informa- ção temos sobre o outro, maior nossa capacidade, conclui Ickes. Com a colaboração de colegas e alunos da universidade, Ickes fez um experimento: deixou duplas de estra- nhos (que não sabiam do estudo) em salas de espera vazias por seis minu- tos e filmou sua interação. Emseguida, cada indivíduo teve de ver o vídeo, dizer emque estava pensando durante a espera e tentar adivinhar o que a outra pessoa estava pensando. Ickes, então, comparou os relatos. Alguns, como a dupla a seguir, erra- ram feio: Ele disse: Estava pensando que pre- cisava fazer a barba. Ela inferiu: Ele estava tenso por cau- sa do silêncio entre nós. Já outros leram perfeitamente a mente alheia: Ela disse: Estava encabulada, pois a impressão é que todo mundo espe- ra que você já tenha escolhido uma especialização. Ele inferiu: Ela estava encabula- da por ainda não ter escolhido uma especialização. Ickes descobriu que nossa capaci- dade de “ler” um estranho durante uma interação de seis minutos é limi- tada, mas outros experimentos mos- traram que acertamos muito mais ao ler o comportamento de amigos. Não é lá uma surpresa – embora seja sur- preendente saber que, quando par- ticipantes de um estudo passaram um pouquinho mais de tempo com umdesconhecido, sua capacidade de A leitura cotidiana da mente se baseia na inferência do que o outro pensa e sente em determinado momento
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