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revista de jornalismo ESPM | cJR 63 “Umcidadão que respeita as leis do país no trabalho e na vida pessoal não temnada a temer”, declarou emjunho de 2013 o entãoministro das Relações Exteriores do Reino Unido, William Hague, na esteira dos primeiros rela- tos do Guardian sobre a extensão da massiva ciberespionagempor agências do governo. Hague acrescentou que gente sem culpa no cartório não pre- cisava “temer que o Estado ou órgãos de inteligência britânicos estivessem ouvindo o conteúdo de suas ligações telefônicas ou coisa equivalente”. Obviamente, amaior parte dos jor- nalistas e a maior parte das fontes é justamente isso: gente que respeita a lei e não tem culpa no cartório. E, obviamente, boa parte do trabalho mais importante que fazem depende de indivíduos dispostos a falar em caráter confidencial sobre coisas das quais têm conhecimento direto. Confidencialidade não significa nada se um terceiro puder facilmente inferir com quem um jornalista vem falando – vasculhando seus registros telefônicos, contatos, e-mails, mensa- gens de texto ou descobrindo quem mais estava emdeterminado lugar em determinada hora. Mundo dos metadados Ao jornalista, tampouco serve de con- soloouvirHague garantir que oEstado britânico não está ouvindo o “conte- údo” de suas ligações telefônicas. Um policial ou espião não precisa aces- sar o “conteúdo” de uma comunica- ção para descobrir a identidade de um informante ou uma fonte. Afinal, esta- mos nomundodosmetadados: a infor- mação acessória (não o conteúdo) que em geral pode ser obtida sem man- dado ou supervisão judicial, e que diz muito sobre nós. Antes de Snowden, uma minoria versada no assunto certamente sabia o que era um metadado. Depois de Snowden, ninguém que mexe com jor- nalismo (e direito, medicina ou qual- quer outra profissão que envolva confi- dencialidade) tem desculpa para igno- rar o que é ummeta- dado. As próprias agências são bas- tante francas sobre o valor de saber esse “quem, aquem, onde, quando”. Stewart Baker, ex-diretor jurídico da NSA (Agência de Segurança Nacional americana, na sigla em inglês), disse numdebate em2013 patrocinado pelo Guardian emNova York: “Metadados revelam absolutamente tudo sobre a vida de alguém. Na presença de quan- tidade suficiente demetadados, o con- teúdo é dispensável (...) [Chega a ser] constrangedor quão previsível nós, seres humanos, somos”. Indícios de que forças públicas de segurança e órgãos de espionagem têmacesso a esses dados sobre fontes de jornalistas são abundantes. Sabe- mos, também, que espiões britânicos não dão muita bola para o sigilo da relação entre advogado e cliente. Nos Estados Unidos, a guerra do governo Obama contra vazamentos levou à perseguição brutal de informantes – incluindo a notória iniciativa do Departamento de Justiça americano para obter, na surdina, dois meses de registros telefônicos de mais de Latinstock/Oscar Garrido Ruiz / Demotix Transmissão ao vivo de Edward Snowden, em maio, no EDOC Film Festival, em Quito (Equador)

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